sexta-feira, 27 de julho de 2007

Contos e Crônicas postados no Bar do Escritor part.II


DELIRIUM TREMENS

Ele estava doído. Seria a solidão?
Doía ao sentir-se irritado com a própria presença. Ela lhe machucava mesmo na rua quando pouco importava, se era noite ou dia. Percebia-se na própria dor ao conversar no telefone por insistência dela, justo ela, que tanto amara e hoje nada mais representava que o desalento em palavras, morto em transmissões via satélite e sepulto nos fios do seu viva-voz. Afinal, o que exatamente lhe incomodava?? Perturbava-o a sensação de haver falhado em algum lugar. Incomodava-o o fato de não ter conseguido causar ou manter qualquer interesse que fosse. Doía se ver dilacerado, sentir-se por si enganado. Feria-se ao vestir da falsa fé e ainda crer que poderia surgir fatos bons, todos por acontecer. Sangrava porque não sabia a fórmula e, não havia nada que o fizesse voltar a sorrir. Foram tantas as coisas que imaginou. Foram tantos os sonhos que, hoje, havia até o medo de sonhar. E quanto as ilusões? Foram exaustivas e todas haveriam de vingar mas, no fim um blefe e tudo se perderia em devaneios, inconsistentes, tal qual o ar passar por entre os vãos dos dedos. Era preciso manter os pés nos chão e qua jamais deveria permitir que os desvarios sobrepusessem-se aos fatos e, fundamentalmente, da forma que eles eram. Fórmulas mágicas? Para ele existia uma única; a bebida. E com ela, ele bebia a vida, tragava a realidade , nua, crua e sem ilusão. Era necessário beber para se manter na lucidez. E o pleno estágio da verdade se dava ao sentir-me embriagado. . E assim, a boca mole, silabando “SSSSSS”, em frases babadas no balcão, endireitava até o chão se lhe parecesse torto mas, era o efeito o poder da bebida que o tornava suficientemente forte pra questionar de si o seu conflito mediante a vida.. Então perguntava por que a vida o dilacerava.
Por que ela insistia em zombar de si. Quais os motivos ele lhe dera para que fosse transformado no mais vil e indiferente dos humanos. Não lhe havia qualquer traço de afeição, nem mesmo com o pai, a mãe ou qualquer parente. Não havia em si a menor sensibilidade que o fizesse discernir a beleza duma flor e o alívio do espírito no regalo do amor. E por que os momentos de incerteza o faziam confiar menos em Deus e mais no diabo?
Ele não sabia de todos esses por quês Ele só sabia que enquanto sóbrio não vivia. Só sabia que bêbado, ignorado no mundo, jogado num canto num monólogo absurdo e insano ele não sofria. Não havia a parte física da dor, já que era a alma que lhe doía.
E então, sabendo de tudo isso, cada vez mais, ele bebia.


AOS MENINOS DOS ANOS 60...UMA HOMENAGEM

Eu queria as suas "minas", ter aquelas "bekas", vestir suas "Levis" e seus sapatos da "Cougar". Eu queria os seus fuscas, as putarias nas madrugas, queria estar no Arouche passando a mão nas bundas das safadas. Eu queria as estaturas dos grandes, ser os seus corpos em movimentos, fazendo amor com uma gostosa, tão inacessível ali, num banco reclinável do carro estacionado no drive-in do bairro. Eu queria ter as penugens no rosto , queria estar no Aurora, primeira fila, assobiando, pênis ereto ali, diante dos streapteases das bundas mal feitas e dos peitos de fora. Eu só queria ter a grana pros "catecismos" a cada quatro semanas. Eu queria, ser o garoto prodígio, tipo de "Robin", queria ser o escolhido pela garota do rosto mais bonito, nas noites de carnaval do meu time favorito. O que eu queria era me sentir um deles. Eu queria estar na "crista da onda", tomar o guaraná do "Teobaldo" com o uisque Red Label. Eu queria "muita coisa", queria ser de Liverpol mas, não podendo, ao menos, ser tal qual o Lennon, correndo dos gritos das gurias e, se pego, agradecer num inglês de jogadas, carregado nas gírias. Ah, como eu queria. E eu queria tanto, queria o mundo e a porra da idade não me deixava. Eu tinha apenas treze anos.




Contos e Crônicas postados no Bar do Escritor part.I


INTROSPECÇÃO

Talves a natureza aguarde algum momento propício. Talvez, aguarde que o amor esmoreça, que a lágrima não role e que os sentimentos nos abandonem.
Talvez ainda veja em nós algo de amor e alguma solidariedade nas sensíveis lágrimas roladas nas faces dos emotivos. E quando esse dia chegar o sol e a lua se aperceberão. Ele, a sorrir um riso triste, morno, inerte, quase que sem vida. Ela, nostálgica, melancolicamente refletida como a lágrima de mulher.
E, se assim for, talvez ao se encontrarem, sol e lua resultem em fenômenos, sei lá, daqueles que torne insano o mercúrio dos termômetros ou, que derreta em segundos todo o gelo dos aceanos glaciais. Talvez, permanecemos aqui porque os sentimentos ainda não se foram por completos e, as lágrimas, por hora, ainda descem em faces emocionadas. Talvez, e só por isso, que ela, a natureza ainda nos dê um pouco mais de tempo.
E, talvez, quando nada mais houver pra ser vivido, quando de nós tudo houver partido, eles, sol e lua se unirão num mútuo e doloroso abraço e, ali, no riso o triste e de escárnio, no ato irônico e lamentável irão nos proporcionar o fim. E então nada mais haverá que possamos fazer e, nem mesmo nos será permitido agraciar a grandeza desse momento. Ele será magnífico, devassador, eclodido na mais deslumbrante pororoca sideral.





A FOTOGRAFIA

Sempre o mesmo cenário. Noite chuvosa, raios e trovoadas.
Num cômodo de cortiço, ele bebia. A feição sombria e o olhar de gelo não deixavam transparecer qualquer emoção naquele sujeito. Talvez fosse o seu olhar mais gelado que a estúpida cerveja que emborcava. Fitava fotografias de mulheres, fixadas atrás da única porta. Curiosamente, todas as fotos eram de mulheres grávidas. Eram sete fotografias, todas presas por taxinhas. Das sete, cinco estavam assinaladas com um imenso "X". Ele detinha-se na sexta e achava bonita aquela garota loira, talvez 25 ou 26 anos, o seu serviço de logo mais. Retirou-a meticulosamente da porta, e com o necessário cuidado para não lhe rasgar o papel. Com o dedo indicador contornou sutilmente o rosto de um sorriso meigo e acariciou os cabelos aloirados para em seguida fixá-la no mesmo lugar.
Tinha que certificar-se que que não haveria a menor condição de algo dar errado. Pousou os olhos na mesinha de cabeceira e lá, acima do tampo repousava uma kodac, dessas baratas, descartáveis. Desprezou-a, já que não precisaria dela por hora.
Ao seu lado se encontrava a navalha, essa sim, necessária. Foi até lá, pegou-a e colocou a lâmina no bolso dianteiro da calça. Caminhou até a cadeira e do encosto retirou a jaqueta e, antes que saísse fixou-se na sétima foto. Ela se dispunha um pouco distante das outras. A princípio olhou-a com indiferença. Os segundos, nervosamente passaram e então a surpresa; Do rosto gélido rolou a lágrima.
Foi única. Uma lágrima de dor, de dilaceração. Pegou-se piegas ao estar chorando, ali, diante de um pedaço de papel. Sim, papel e não foto. Nele, não havia qualquer fotografia e, apenas algumas letras mal grafadas e com a falta do til, onde se lia; MAMAE. Vestiu a jaqueta e saiu. Julgava ser mais um serviço necessário e que por ele deveria ser feito. Nunca existiu uma mãe pra si, então, justo não era que houvesse para outros. Estar vivo, pra ele, nada representava.
E, na posse da plena loucura se lamentou de não ter tido pra si, um igual a ele.


3054. O VÔO DA MORTE

3054; três, zero, cinco, quatro.
Não, não foi o prêmio de milhar.
Foi o número de um vôo, da Tam. Foi mais um descaso dos que acham que não há a obrigatoriedade de vidas a se manter. Pra que? Besteira! São seres humanos Dá nojo do descaso com o qual somos tratados. Afinal, que nós somos além de seres humanos? Foram 186 de vidas assassinadas. Vidas ceifadas pelas irresponsabilidades das autoridades competentes. Competentes? Isso sim é uma piada! Talvez o mais triste não é o saber que se morreu (se é que há como saber)
E às vezes morremos por nossa conta e riscos. Morremos pelo desgaste dos nossos corpos ou dos muitos anos. É obvio. E, se aqui estamos, sabemos aqui é para morrer. Então, o problema não é esse. O infame, nesse caso, foi ter partido sem saber, sem ter ao menos a chance e de se bater o dedo no sinto de segurança. Se foi a pista, a drenagem, a imperícia, o comando aéreo ou outro qualquer órgão que e tenha um mínimo de responsabilidade, foda-se! Gostaríamos de saber, se é que aparecerá o responsável (nunca o governo exerce qualquer culpa). No fim, e após uns bons anos de desgaste, fazem um acordo indenizatório e fica “tudo como dantes no quartel de Abranches” Isso é muito triste e injusto. Eu só sei que se foram quase duzentas vidas. Bobagem! O que eram eles?
Sómente seres humanos. Pra que se preocupar?
Sei lá, porra!

domingo, 22 de julho de 2007

Loucos felinos.


As coisas, pra ele não estavam boas. Dado Gutierrez, o pseudônimo de Gustavo, um escritor não publicado, rejeitado por editores, frustrado por receber sucessivas negativas dos contos que incansavelmente enviava pelo Correios. Algo não andava bem dentro de si e talvez as suas estórias revelassem a viciada ótica que dissecava o mundo. Invariavelmente seus textos falavam das desgraças e misérias afeitas ao ser. Eram contos que privilegiavam o desamor ao amor, desagregados de qualquer bom sentimento humano. E, da sua mente nada fluia que não fossem os assassinatos, coisas desesperançadas, chegadas ao fundo do poço e que tinham a morte como companheira. Estava se sentindo um quase morto-vivo. Disperso, jogado no sofa, emborcava seus vinhos ordinário, e com o olhar cravado no nada deixava-se flutuar nas lembranças e, então se pegava questionando o que fizera da sua vida. Onde estava a coragem da juventude? Onde estava a época que encarava com altivez os desafios que a vidalhe impunha? Ele não sabia. Sabia da angústia dentro si, talvez a falta de alguém que o fizesse deixar de sentir-se daquele jeito. Mas quem seria o alguém? Onde estaria? Há muito já desistira de procurar, e não mais haviam os anseios e ilusões que o motivaram na juventude. A frivolidade imperava em seus relacionamentos e, tudo lhe paraceia tão falso. E assim, solitário, fizera do mundo virtual a sua única arma, a legítima defesa diante das hipocrisias de um mundo real e ferino. Plea virtualidade transitava em comunidades literárias, procurando algum reconhecimento naquilo que se julgava injustiçado, como se as pessoas pudessem vislumbrar o brilhantismo dos seus contos, coisa que os insensíveis editores não conseguiam assimilar. Uma cambada de idiotas!pensou.
Mas, Injustiçado? Como? Sabia que se apegava aos seus enganos já que nada de interessante conseguia criar e, os leitores não se satisfaziam com contos que insistiam em re tratar a vida como uma desgraça respirada, suspirada pelos miseráveis do submundo, danca perfeita de perdidas alegrias.E assim, desesperançado, fugido da realidade tal qual um bandido descuidado, só se apercebia que no mundo virtual os relacionamentos se davam fortuitos, gélidos, insinceros. Sem saída, se via abandonado pelas idéias e desprezado por uma boa estória que insistia em não lhe vir na mente, que o fizesse conhecido. Em sonhos, agora, meros pesadelos, se via dedicando livros em noite de autógrafos, sentindo os tapinhas da bajulação a lhe acariciar as costas. Delírios!
Ansioso, procurava desvincular-se do escritor fracassado que era e, então começou a frequentar as salas de bate-papo. Quem sabe não encontrasse ali alguém que pudesse ver nele algo mais do que um escritor sem talento? Quem sabe se não pudessem vê-lo que não um peso morto? Seria bom que lhes percebessem o sujeito legal e sensível que era, exímio construtor de frases de efeito, ledor das sensibilidades carregadas na alma. Saberia sair-se bem?
Ah, sim! E ele haveria de prová-lo.

Para ela, a vida também não se mostrava maravilhosa. Nanda, assim lhe chamavam carinhosamente seus amigos e parentes. Amanda, nome de nascença, era uma mulher bonita, mãe de um de adolescente e que já passara por maus pedaços nesta vida. Separada há anos, ainda não conhecera um verdadeiro amor. Na juventude, poucos relacionamentos, aliás, dois, já que, filha de pais severos nada logrou que senão namoros vigiado pelos olhos atentos dos pais, no casto sofá da sala, . Criada numa época de conservadorismos e conservadores, saiu de casa para ir pro altar com o segundo namorado por quem se julgou apaixonada . E era isso que ela vasculhava na memória, ali, sentada na cadeira da sala de reuniões da escola do município. Acabara de sair exausta de uma aula onde os alunos lhe deram trabalho. Pacienciosa, procurava cativá-los e, mesmo que não o conseguisse por completo ritimava suas aulas de forma que não atrapalhasse o planejamento diário. Suspirou longamente, levantou-se e encaminhou até a pequena geladeira adormecida num canto da sala e de lá retirou a jarra do chá-mate.Adorava o chá. Ah! se a vida pudesse ser tão saborosa quanto o delicioso líquido negro. Tentava ser feliz e o era em parte. Imprimia ao dia-a-dia a mesma filosofia traçada para enfrentar aqueles garotos difíceis. Nunca fora de procurar qualquer relacionamento afetivo e, muito menos rodar por bares da moda a cata de alguém, mesmo que interessante. Convites, claro, nunca lhe faltou e eram comuns já que suas amigas, insistentes, ligavam convidando-a para algum programa. Por vezes se pegou aceitando-os, afinal, um pouco de divertimento jamais lhe faria mal. E, nestas ocasiões não ficava a mercê das vontades das amigas e ia com o seu carro e, assim poderia retornar quando quisesse, caso a noite não lhe parecesse interessante. Fizera isso algumas vezes e, chegado em casa, sentia o vazio na procura do nada, já que nunca se acostumara com os relacionamentos boêmios e sempre desconfiada dos homens que faziam da noite a sua forma de vida. Portanto, imune, preferia retornar e ficar em casa, ao lado do filho onde, invariavelmente o encontrava jogando no computador
- Mãe! Acabei de usar o pc, quer entrar na net? – Perguntou Paulo, numa dessas noites.
- Sim filho, vou entrar! – E assim adentrou na cotidiana virtualidade da costumeira sala de bate-papo.

(22:30:24) – N@nda entra na sala :
(22:31:08) - N@nda fala para todos : Boa noite, gente!

Naquela sala fizera muitas amizades e, onde, inclusive, teve um breve relacionamento virtual mas, como a virtualidade nunca se fazia real, não prosperou.
Entrava ali para conversar, se divertir com os amigos e com as brincadeiras que se davam por lá. Igualmente, ficava atenta à leitura da sala e, perspicaz que era, reparava em toda sua movimentação, sabendo desta forma o que estava se passando por lá. Em retribuição, foi cumprimentada por todos, conforme reza a cordialidade virtual.
Naquele momento um nick entrava na sala e ela, por motivos que não sabia, se sentiu atraida.

(22:35:19) - D@do entra na sala :

Dado era quem a atraia. Ele, assim que antrou, por curiosidade percorreu a lista de nicks dos que lá estavam. Haviam muitos; Larissa, Boneca de Pano, Amor (M), MorangoDoNorte, Loba Faminta, Perdidonacidade, dentre tantos outros. Olhou novamente e achou curioso aquele “@” do nick da N@nda. Coincidentemente o seu "@" era a segunda letra. Inexplicavelmente uma sensação gostosa e agradável lhe invadiu. Fixou-se no nick por mais alguns instantes e então se decidiu:

(22:40:10) - D@do (reservadamente) sorri para N@nda : Oi! Tudo bem?

Haveria resposta?

(22:40:40) - N@nda (reservadamente) fala para D@do : Tudo bem, e com você?

Daquele momento em diante algo mágico acontecera. Naquela mesma noite conversaram por horas a fio e sem que ninguém os lesse. Foi um diálogo gostoso, agradável e a ponto de se verem pegos em afinidades, sincronicidades; diriam os mais intelectualizados.
A partir daí começaram a se relacionar. À princípio, uma relação de amizade e, com o passar dos dias algo mais forte. Por interesse e necessidade trocaram os seus MSN. E lá, naquele íntimo meio de comunicação se conheceram a valer. Lá, falaram de si, de suas angustias, tristezas e expectativas. Falaram de suas famílias, desilusões e esperanças. Viram-se através de imagens, falaram por meio de microfones e a intimidade, cada vez mais tornava-se inevitável. Percebiam-se nas reações um do outro e, entaõ, finalmente, fizeram amor virtual. Inicialmente as palavras soaram tímidas, depois, viscerais, possessivas, dessas que fogem à compreensão de quem não tem por hábito frequentar a internet. Lá, eles praticaram todas as formas a virtualidade do amor. Se excitavam ao ouvirem suas vozes, sussurros e as expressões de um linguajar erótico, sem rodeios, sem constrangimentos.Era uma sensação deliciosa e tudo lhes parecia tão real, como estivessem possuindo e se deixando possuir, completos e sem qualquer pudor. E o sentimento fortalecia-se e tão latente era o carinho de intensa a cumplicidade, como se pudessem os toques e os sons de suas vozes vestirem a louca fantasia da realidade, perdidos naquele oceano de sensações. Lá , eles se amavam com fúria, aflorarados em seus desejos, e devaneios. Em Nanda, a libido exacerbava e fazia dela, mesmo que virtual, a felina qu no cio, uma navalha afiada, cortante, retalhando o invólucro e deixando transparecer o belo, o romântico, o sensual. Lá, eles se possuíram, se tocaram, doaram suas essências em líquidos de tantas noites, deliciados em prazeres, ouvidos nos sussurros, extasiados em gozos. E era tanta a expectativa e a inabalável sensação de felicidade que lhes foi impossível protelar o encontro.

Quarta-feira, 20 horas, combinaram ambos. No dia e hora acertados, o encantamento de dois seres se encontraram. Foram momentos mágicos e, nem importava qualquer dessemelhança que não correspondesse às imagens que cada um havia para si, isso já não fazia qualquer diferença. Foi inevitável o render-se ao deslumbramento dos olhares, de perceber o mesmo timbre na voz, o aroma da pele e o doce dos lábios.
E foi assim, naquele bar. Cúmplices em olhares, tomavam os seus drinks e sorriram todos os sorrisos que haviam para sorrir. Sentiam-se dois adolescentes apaixonados. Ali, sentados em cadeiras de bar , suavemente acariciando as mãos úmidas e ansiosas foi que vislumbraram a real possibilidade de terem sido feitos um para o outro. Certeza? Não havia a certeza de nada e era apenas a infinita vontade para que tudo desse certo.
E então, perdido no sensível beijo de mulher ele percebeu que as coisas poderiam ser diferentes para si. O sorriso brotava de sua alma. Era a nova possibilidade, mais que real, de se desfazer dos insucessos, dos fracassos, tal era a sensação que emanava daquele ser tão meigo, tão feminino e irremediavelmente doce.

domingo, 8 de julho de 2007

Avô e neto......francamente.


- Vovô! Por que minha mãe nunca está aqui? Perguntou ao senhor Duílio. Ele, 63 anos, sentado num espreguiçadeira, enrolava o cigarro de palha, de fumo-de-corda, hábito adquirido ainda nos tempos de roça. Em que pese toda a riqueza acumulada com os grãos de soja, obtida através de muita obstinação, era o seu Duílio, uma pessoa humilde, carinhosa e de nenhuma afetação. Pensou por alguns instantes na questão do neto:
- Sabe Felipinho. Sua mãe é uma mulher sonhadora, daquelas que acham a vida do mundo mais interessante que a vida em família. – Atento, percebia a curiosidade do pequeno Felipe, quase 11 anos de idade que o olhava fixamente por sobre “O Pequeno Príncipe” que portava entre as mãos.
- Vô! O que quer dizer “TORNAR-SE RESPONSÁVEL POR TUDO AQUILO QUE CATIVAS” - questionou o pequeno ao ler naquele momento a passagem no livro. O avô parou de enrolar o cigarro, pensou por alguns segundos e respondeu:
- Felipinho, quando você conquista uma pessoa, um mérito ou até mesmo a amizade de um animal, significa que deverá ser responsável pelo que conquistou. Terá a responsabilidade de tratá-los bem, com respeito e muito carinho.
- Ah, vô! Entendi! Por exemplo.. Estou “namorando” a Angélica e isso significa dizer que sempre serei responsável por ela, é Isso? – disse, arregalando os olhos O seu Duílio sorriu e meditou sobre a profundidade da argumentação do neto, afinal, o garoto era esperto, mas, levava ao pé da letra o que ouvira dele. Tentou rmediar a situação.
- Felipinho! Definitivamente, as mulheres não se incluem nesse entendimento, portanto, não fazem parte desta regra. - O garoto ficou a olhá-lo e a dúvida não abandonara o seu rostinho já que, a resposta do avô o deixará sem qualquer base de entendimento. O avô, percebendo que lhe causara mais dúvidas, tentou explicá-lo de uma maneira que Felipe pudesse entender.
-Felipinho, o que eu quis dizer é que, por mais que tentemos conquistar uma mulher, por mais que sejamos carinhosos, atenciosos e lhes causemos o bem estar, por mais que façamos isso, na verdade, ela nunca nos entenderá e procurará de alguma forma ou de outra levar algum tipo de vantagem.
O garoto a tudo ouvia mas, ao contrário do que supunha o avô, isso lhe trouxera mais dúvidas do que novas explicações. Nesse meio tempo soou a campainha. Era o advogado do senhor Duílio que fora em sua casa para colocá-lo a par dos últimos acontecimentos. Encaminharam-no exatamente onde se encontravam o velho e a criança. Vencido o jardim, o advogado encontrou o seu cliente, deliciosamente espreguiçado na piscina. Ao percebê-lo, o senhor Duílio cordialmente se levantou. Cabelos grisalhos, corpo ainda razoavelmente bem conservado, além da velha e boa classe.
- Quais são as novas, doutor Carlos? – educadamente se reportou. - O advogado, com ares de preocupação, retirou da maleta executiva o calhamaço de papéis e então, depois de acomodado noutra espreguiçadeira, deslanchou:
- A Martha, sua ex-esposa reivindica uma pensão mensal de R$ 15.000,00 e quer para si um outro imóvel, exatamente o apartamento do Guarujá, já que, segundo ela, o foi adquirido na união estável, portanto, fora do alcance da “separação parcial de bens”
-Aquela garota, a Dione, nos procurou. Disse que não lhe disse já que ficou com medo da reação do senhor mas, garante que há um filho dentro de si e, que esse filho é seu. Nos fez uma proposta: antes do DNA aceita uma pensão mensal de R$ 18.000,00 e abre mão de todo o resto. Agora...Se for necessário o DNA..Aí diz que o assunto será tratado de outra forma....
- Déborah, sua filha, mãe do Felipe, está em Londres e novamente solicita dinheiro para a sua manutenção. Exatamente 50.000 euros - Tudo relatado, aguardava as instruções do seu cliente.
O senhor Duílio ouvira com atenção as explanações do advogado e então rebuscou na memória.
Martha. Conhecera essa mulher havia dois anos. Era prostituta. Lembrou-se da noite chuvosa e do ponto que fazia na República do Líbano. Estacionado o veículo, Marta dirigiu-se a ele, amparando os cotovelos na janela do passageiro. O rosto bonito, o corpo perfeito dos seus 24 anos e a maciez da voz de quem sabia que ali estava um figurão. Encharcada, mostrou-se tão frágil e próxima que, as suas carências, seriam a partir dali, divididas. Daí a estar dentro da sua casa dando ordens aos empregados fora um pulinho. Estabilidade conseguida, havia deixado de existir a prostituta. Em seu lugar surgira alguém que em roupas caríssimas e de grife, trepava descaradamente com os melhores amigos de Duílio.
Dione: uma menina linda, talvez uns 22 anos, vinda do sul e que se candidatara ao posto de camareira em sua casa. Foi nervosa para a entrevista já que encontrava-se em situação difícil, morando de favor numa kit de uma amiga, incomodada com a sua presença. Dona de incríveis olhos azuis, de um rabo fenomenal e do exótico sotaque gaúcho, supria em parte e de forma satisfatória as habituais “escapadas” de Dona Marta. Foi demitida por esta ao ser surpreendida furtando-lhe uma de suas jóias.
Déborah: sua filha, mãe de Felipe, uma porra louca, sempre envolvida com os homens da pior espécie, rodava o mundo incessantemente e sempre, profundamente se sentindo infeliz. Portadora de revolta incontida, cujos os motivos jamais os foram sabidos, tivera Felipe com alguém que nem ela sabia quem. O instinto impudico havia se manifestado desde o tempo que a falecida mãe ainda gozava de saúde. De todos, era ela o caso que mais o amargura.
Saído do transe, voltou-se para o doutor e lhe passou as instruções necessárias.
O pequeno observava-os e acompanhou com o olhar a saída do advogado jardim afora.
Novamente a sós, avô e neto, Felipe, outra vez o olhou por sobre o Pequeno Príncipe;
- Vovô! entendi agora. Pelo jeito, o senhor tem cativado coisas em demasia! - E abriu um sorriso com um que de malicioso. Aquilo fez o velho Duílio rir. A princípio discreto, depois, entrondoso. O velho soluçava de tanto gargalhar e a sua barriga doia de tanto ir e vir quando o pequeno ouviu a resposta esganiçada:
-Ô!