terça-feira, 3 de novembro de 2009

Lamento


A obscuridade que me toma não se benze e nem exorciza - Os ratos escarnecem de mim quando os vejo pelos vãos dos bueiros antes das migalhas da meia noite.
Talvez com alguma razão: Incompreensível, não me embebo nas águas das chuvas e nem reflito nas conchas transbordadas nas calçadas de concreto.

O espelho que me olha intimida-me a carcaça: Muitas vezes flagra-me permutando peles que nem cobra, afrontando-me na nefasta idolatria que nutro ao logro. Eu não consigo fugir, e ele, insatisfeito questiona-me.

- Quanta vez sepultou o que hoje tenta ressuscitar? -
- Infindáveis vezes – Antecipa-se, estilhaçando-me com suas verdades.

Porém a vida impinge-me um sempre em frente e eu tento não olhar para trás. Contudo, seduzido, volto.
– Poderá o míope-astigmata divisar a linha antes que ela se torne turva? –

Assevero-me nas vistas e refaço os pífios caminhos que aniquilei.
A visão não se encontra tão prejudicada que não me faça dar conta da vis indiferenças com as quais sobrevivi. Algo não está bem naquele ambiente de devastação; dou por falta de lágrimas nas árvores que minha lâmina decepou.

Subitamente caio em mim: Elas não me escassearam pelos sofrimentos das ramas, mas sim pela privação de pranto que se hospedou em mim. Um pranto de pó, doído, que entorpece, que não consente que me banhe nas águas da ostentação, que não me aquece diante das vozes da prepotência e nem da intempérie dos ventos do sul.
Um pranto inexistente, que causa desprazer, que me torna perceptível à insolência dos poetas pérfidos, que me combali, humano e mortal diante do acervo de erudições desnecessárias, psicografadas opressivamente nos fortes tons das tintas nanquim.

E assim eu sorrio um sorriso triste de quem se encontra fora de lugar.
Um riso melancólico, de alguém que vislumbra tórridos e insensatos sóis em dias carmim. E assim eu sou, e me induzo refém das coisas que jamais me foram gratas: não necessito desfazer os nós das amarras perfeitas e nem desguarnecer as armadilhas de tudo que se entende por íntegro.
A cada dia, um dia a menos há em minha vida, e eu queria apenas ter compreendido todas as dez linhas que li. Desfazer-me da louca quimera que me insulta, do monstro com cauda de dragão que bafeja ares fétidos em minha nuca. Ver-me liberto da máscara de ferro que molda meus devaneios, da mordaça que asfixia, das enormes bolas de aço acorrentadas que me tolhem os movimentos.

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