sábado, 24 de abril de 2010

Porfírio, a Marques Sapucaí, e os McPherson



Eu vinha de São Paulo e estava com 22 anos quando conheci os McPherson no Rio de Janeiro, onde a Mocidade Independente de Santo Onofre desfilaria na Marques de Sapucaí. Domingo de carnaval e lá estava eu na avenida. Eu achava curioso como nós brasileiros éramos ávidos em homenagear culturas além fronteira, principalmente a norte americana, como se ela fosse um Fundo Monetário Internacional de alegorias e adereços e cheia dos quas quas quas. E por falar em quasquasquas, eu me vestira da fantasia de Pato Donald, comparada de última hora no barracão da agremiação. Sobre ela, achei-a de um mau gosto terrível; um complexo de penas brancas que ia dos calcanhares até o pescoço. Acima do corpo penado vestía-me uma camiseta de marinheiro ao estilo Popeye, e, no rosto, saindo de onde se localizava a boca,  um imenso bico de pato formado por duas grossas  bases de isopor  pintadas num amarelo gema que, quando abertos deixavam à mostra uma enorme língua vermelha, tecida em veludo grená. Isso sem falar nos pés, obviamente de pato, enormes, que me desequilibraram por duas vezes durante o desfile. Mas tudo era pela melhor  das causas, já que talvez Walt Disney se sagrasse campeão do carnaval carioca.

-Olhaí gente! Se unam bem espremidos! – Era o Carlinhos Boca de Pito – o puxador de samba da escola que, num português sofrível convocava os componentes  para a concentração.

-Vamo mostra pra esse povo que nóis tem raça e podemo levantá esse carnaval!E pra isso temos três bijetivo: Primeiro; o amor pelo Onofre – segundo: A Raça! – Terceiro: Samba no pé!

Ao meu lado um casal extremamente pálido batia palmas e tentava sambar. Tentava apenas, logo se via que o par não tinha qualquer intimidade com o samba enquanto tagarelava algo aportuguesado com sotaque inglês, mas de pessoas que tiveram algum longo relacionamento no Brasil:

-McPherson, my love! Eu estar adouruando o nossa escola nesse ano! – Disse a sorridente irlandesa para um maridoque requebrava os quadris e a segurava pela cintura como se quisesse que ela o acompanhasse naquele descompasso absurdo.
 
-Oh yeah, meu neguinha lindo! Eu estar apaixonado pelo Onofre dessa ano! - Exclamou com um entusiasmo exagerado para depois completar -  Só não estar gostando do meu fantasia de pato. Fazer muito calor aqui dentro, Elisabeth! – Queixou-se o Sr.  McPherson com a cabeça mergulhada atrás daquele bico de pato de língua escarlate

Eu olhei para ambos e o sorriso não me abandonou os lábios. Eu achava incógnitos os motivos que faziam esse pessoal sair do estrangeiro para vir desfilar no Brasil. Pelo jeito, Elisabeth também sofria com o inferno dentro do corpo repleto de penas. Foi então que aproveitei o momento que ela retirou aquela medonha  cabeça de pato para refrescar-se  e desembaraçar os cabelos úmidos pelo suor e a percebí profundamente; Elisabeth era linda e parecia feita de porcelana tcheca. Os cabelos avermelhados, os olhos de um azul límpido, a tez alva e aveluda e os lábios grossos e escarlates me fizeram desejá-los para mim. Ela notou que eu a inspecionava.

-Oh, brasileiro! Vamos fazer torcida! Eu acha que nosso escola vai ser campeão neste ano!

Exclamou num sorriso de dentes perfeitos e no exato momento que o sr. McPherson abandonara-nos para engatar na cintura de um desses pecados de mulata. Alta, bonita, pernas fortes e um rabo genial, a sambista vestia apenas um minúsculo tapa-sexo enquanto o seu busto abrigava duas armações retorcidas e vazadas por uma espécie de arame de plastificado que deixavam seus mamilos expostos. Ela parecia não se preocupar com a exposição, muito menos alguns componentes da escola que passavam e davam  tapinhas nas costas do gringo, quando ela exclamou:

-Mac! Mac, seu safadinho! – Pelo jeito  o casal era bem chegado na comunidade de Padre Onofre - deduzi.

E o pilanra do irlandês, assim que se viu enganchado na mulata circundou-a pela cintura e saíram requebrando no meio da ala das baianas que tomava assento. A Sra. McPherson apenas fitou-os ao se afastarem, sem demonstrar porém, surpresa ou ciúmes.E o seu sorriso persistiu no rosto alvo, mas o seu sorrisoja  não cintilava como antes.
Aquilo pareceu doer em mim no exato momento que o trio de cavaquinhos soou nas potentes caixas  do noso carro do som – Fora dada a largada para o nosso desfile –
Surpresa, Elisabeth não mais encontrou o sr. MacPherson pelo decorrer do desfile.
Claro, os meus interesses por Elisabeth me fizeram ficar grudado ao seu lado durante a travessia da avenida. Num certo momento, ainda quase no início, a sra. McPherson parecia esquecer a contrariedade e tentava  sambar o enredo da Escola: “O meu escola está muito linda./Revivendo os desenhas de puro magia/ Desenhei desenhei na minha  coração/ O Tio Walt Disney, trazendo emoção/ôôôôêêêôôô” – Ela cantava alto e atropelando as acertivas.

Por meu lado não me encontrava tão entusiasmado quanto ela; não me surpreenderia se com um samba-enredo e refrão daqueles não fôssemos rebaixados para o primeiro grupo no próximo ano.

Exatamente pelo meio do desfiles já nos pegávamos atracados um no outro. Era estranho apertar a Sra. McPherson através das penas sintéticas. O tato me fazia sentir que havia o volume em seu corpo, porém algo  fofo e oco. Eu não conseguia me desvencilhar daqueles olhos da cor de mar, e eles me eram mágicos c denotavam tanta  esperança quanto os jangadeirosdas  que  além-mar enfrentavam, mas que persistentes  voltavam para seus lares repletos de bons  pescados. E todo o clima não me permitia me concentrar no desfile, e eu me via perdidamente  magnetizado por Elisabeth.
Terminado e já na área de dispersão, a emoção tomou conta dos componentes da escola, contagiando inclusive a Sra. McPherson. Feliz, ela me abraçou um tanto felina e depois separando o seu peito do meu fixou o seu olhar em meus lábios. Pego de surpresa como picado por  traiçoeira cascavel, ela juntou-me pela camiseta do Popeye e me beijou violentamente, enquanto forçava a sua língua para dentro da minha boca. Aquela surpresa libidinosa  deixou-me com tesão e o meu pau eriçou imediatamente por debaixo daquela imensidão de penas brancas
.
Já separados e um pouco constrangidos procuramos por algum tempo o Sr. McPherson, porém sem sucesso - Ele desaparecera - Sem outra saída, rumamos para fora do sambódromo quando,  preocupada com a malandragem carioca convidou-me para acompanhá-la até sua casa. Pegamos um táxi  próximo à Marques e rumamos para la. Foi quando durante o trajeto ela se referiu à residência:
 
-Olha! Nós alugar uma casa na Barra da Tijuca. Todos os anos nós alugar essa casa. Faz cinco anos que nós ficar na mesma lugar- Eu a ouvi atentamente enquanto alisava seus cabelos já livres da terrível cabeça do Pato Donald.

Na verdade, nem era pra eu estar ali naquele momento, mas, a curiosidade aliada ao tesão que aquela mulher me despertara me empurraram pra dentro daquele veículo amarelo. Durante o percurso ela perguntou por meu nome - Porfírio - Eu respodi. E então eu a beijei com sofreguidão enquanto enfiando uma das mãos para dentro do ziper semi-aberto, acariciei os  peitos das Sra. McPherson, avantajados, inclusive  transbordaram-me dos dedos.  Chegado ao destino ela observou com um ar de preocupação que as luzes estavam acesas no interior da casa.
Cautelosamente ela andou pé ante pé e fez sinal para que eu fizesse o mesmo. Sorrateiramente entramos pela casa e atravessando a sala na direção do quarto quando ouvimos gemidos de uma mulher.
Porta entreaberta, flagramos o Sr. McPherson fodendo a mulata da Sapucaí.

-Ah,  seu filho da puta de pau gostoso! –  Gemia a garota -

 Elisabeth, atônita e sem conseguir desgrudar os olhos do absurdo da cena, num ímpeto de fúria rasgou a sua roupa  na altura do peito, trazendo o talho até abaixo da calcinha. Foi então que pude notar o quanto de espetaculares eram os seios daquela irlandesa. Nas extremidades enormes mamilos róseos desabrochavam para mim como se eu fosse o culpado por estarem me fitando. Os devassos,  ao ouvirem o barulho  viraram  assustado e a tempo de ver a Sra. McPherson  livrar-se rapidamente da fantasia e tresloucada vir na minha direção e forçar com as próprias mãos a retirada da minha. E foi dessa forma que a agilidade das suas mãos me deixaram  semi nu e apenas de sunga, negra, por sinal. Ainda mais insana  me empurrou fazendo-me desiquilibrar sobre o grosso carpete do quarto enquanto se livrava da minha cuequinha trazendo-a em seus bons dentes  irlandeses.
Apavorado,  porém excitado, o meu membro enrijeceu enquanto Elisabeth o olhava  assustada, afinal o meu garoto sempre fora um tanto descomunal, inclusive fazendo merecer o constrangido apelido de Picão, quando em minha infância.
O Sr. MrcPherson vendo a esposa afogar-se em meu membro excitou-se, e pediu para que  a mulata  fizesse o mesmo. Ela não se fez de  rogada e exauriu o pobre sujeito.

-Oh, my God, Vêra! - Ele exclamou e flatulou ao chegar rapidamente ao orgasmo.

Comigo as coisas não foram diferentes, e eu transei com a irlandesa por trás, lambi e fui lambido por ambas e até elas esgotarem toda a reserva do meu precioso esperma. O Sr. McPherson, potente apenas na sugação dos  primeiros 10 minutos, dignou-se apenas a fitar-nos no ménage com olhos de aflição: talvez ninguém possuíra a sua esposa até então;  ou na sua presença, ou, que ele soubesse.

Terminado, nos vestimos e sentamos todos na sala de estar quando o Sr. McPherson se dirigiu para um  quartos e voltou com algo na mão: Era sua carteira. Manuseou-a e retirou de dentro algumas notas em dólares e as colocou no decote de Vera; Eram três notas de 100 dólares.  A sra. MacPherson pigarreando ostensiva e  apontando o seu olhar na minha direção, disse-lhe: “Pague o rapaz, também! “
O Sr. McPherson assentiu e escorregou  idênticas notas em minhas mãos.
E foi esse o exato momento da espetacular surpresa: Vera abrindo sua bolsa como se indo guardar seu michê retirou de lá  um revolver, não tão de grosso calibre, mas, um revolver, talvez um 22 calibre

-Você acha que sou putinha de miseráveis 300 dólares, seu gringo babaca? Vamos lá! Quero toda grana!

O casal permaneceu atônito, já que tinha vivência o suficiente para saber que no Brasil, e, principalmente no Rio de Janeiro a vida poderia se tornar como a  de cão.

Assustados e com o revolver apontado para nós três o Sr. McPherson nos levou até o mesmo aposento de onde retirou um falso quadro de parede e  lá abriu um cofre qu.e se escondia por detrás dele.

Foi uma noite espetacular para Vera! Nada menos que  18.500 dolares  estavam no seu interior.
Ainda sob a mira do revolver ele cedeu  o dinheiro que  permanecia com lacres à cada U$ 5.000.
Dinheiro em poder de Vera, ela ordenou ao irlandês que o colocasse numa dessas sacolas de magazine. Amedrontado ele o fez de imediato. Tudo terminado, Vera olhou pra mim e ordenou aos gritos:

-Se manda pivete! E agora, se não quiser levar um tiro! – Claro, eu me mandei o mais rápido que pude. Aquela garota de ingênua nada tinha, e certamente deve ter se apoderado  dos seus celulares e os trancado no banheiro da casa. Como o lugar era distante e cercado de rsidências de ótimo padrão,
comum era o fato destes imóveis serem isolados uns dos outros,. o que facilitara  toda ação da marginal.
Sai de lá correndo e o coração saía-me pelas narinas quando um táxi freou bruscamente ao meu lado.

-Bora, Pivete! O avião sai daqui 30 minutos! Era Vera sinalizando que tudo dera certo.

Talvez aquele motorista de táxi fosse interrogado, mas só saberiam muitas e muitas horas depois que estivéssemos no solo seguro de São Paulo. E para nós não haveria qualquer  problema,  já que  nossas identidades eram falsificadas.

Mas, tudo não fora tão simples assim. A semana difícil no Rio, a  quadra da escola de samba, a nossa apresentação como turistas e interessados em desfilar por aquelas cores. Houvear todo um investimento na infra-estrutura: despesas com estadias numa pousada mequetrefe, com alimentação à base de "comercial", aquele maldito feijão preto, diário e que só me descia na feijoada. O gasto com transportes, cigarros, algumas latas de cervejas, e pra finalizar; e a compra da nossa fantasia.  Talvez o investimento  total  bancado pela Vera deve ter estado na faixa duns R$ 3.500,00 - Portanto, um lucro fantástástico!

E evidente,  a minha função era apenas entreter a Sra. McPherson pelo maior tempo possível, depois que Vera escolheu o seu marido como o perfil ideal para ser "rapado" durante a semana que permanecemos na quadra da Mocidade Padre Onofre.

Chegando em São Paulo, e ainda no aeroporto, Vera deslizara em minhas mãos o menor dos  pacotinhos de dólares.

-Olha aê, Pivete! Leva 3.500 dólares pela participação! - Não pegue o taxi no saguão. Pegue diretamente na rua! - Ela insistiu comigo - Ela sabia das coisas.

Eu agradeci e rumei para a saída e atravessando os pátios internos do aeroporto dei na avenida. De lá acenei para o primeiro taxi que surgiu e entrei no Vectra branco e pedi para o motorista que seguisse para o Jardim Tiradentes. Quase 30 minutos após ele me deixou numa casa simples e de muitos comodos; eu ocupava  o último quarto, algo de aéra total com menos de 6 metros quadrados. Aquele era o meu paraíso, e claro, eu era milionário!

Ja deitado em minha cama analisei toda a ação. À primeira vista poderia parecer que fora um golpe fácil, mas não era bem assim, já que qualquer deslize ou falha  estaríamos vendo o sol nascer quadrado lá pelos fétidos presídios do Rio.
Fora sim um golpe de sorte. Não, definitivamente não era essa a vida que eu merecia e que serviria pra mim.
Eu queria algo mais limpo, refinado, digno.
Esperei pela chegada da quarta feira de cinzas e na parte da tarde procurei um balcão de anúncios de um grande jornal. Um senhor, funcionário do balcão,  recebeu o meu anúncio e o leu com esmerada atenção:

“Jovem de nobre estirpe, ótima aparência, bem dotado e com experiência internacional oferece-se para companhia de mulheres em batizados, casamentos, festas de aniversários, ou qualquer tipo de evento social. Período mínimo de 5 horas. Preço justo. Tratar c/ Porfírio pelo cel. 11-8588 8888 –“

-Quanto é o anúncio, tio? – Perguntei-lhe

-35 mangos – Respondeu com feição franzida.

Joguei-lhe na mão uma nota de 50 pratas.

-Fique com o troco, amigão! - Disse-lhe com ares de que não me faria falta aquele troco.

Ele me olhou, primeiro, agradecido, depois, com alguma inveja.

Ele podia vislumbrar à sua frente  um jovem de futuro promissor que conquistaria mais que um mero emprego num balcão  de classificados.

-Au revoir, tio! -

Acenei-lhe com os dedos  numa quase continência  militar ajeitando a nova  carteira de couro no bolso da não menos nova calça da  TNG. Olhei para os meus pés e  eles eram os maiorais dentro dum confortável  Nike Shox, legítimo,  e que me tinha custado pra  mais de 500 pratas.

Talvez ele imaginou que  eu o estivesse esnobando, então olhou-me de soslaio, com certa indiferença e voltou-se para um novo cliente que adentrava à loja. Eu sorri comigo mesmo; eu tinha toda uma juventude pela frente; eu tinha as mais belas mulheres que me esperavam avidamente.  E ele? Ele,  apenas mãos calejadas,  a caneta Bic e algumas folhas de papéis para anotações.

Saí para a rua e elevei o meu  olhar para um sol de meio de tarde e os seus raios me ofuscaram a vista. E isso me convenceu que eu merecia um par de lentes negras da Oacley; Não desses óculos falsificados e comprados em meio à balburdia dos camelôs, mas um de loja boa, com nota fiscal e certificado de procedência.
Segui adiante e na direção da padaria enquanto astro rei persistia ferindo os meus olhos:  mas tudo era uma questão de autoridade, afinal era ele  o  magnânino enquanto eu apenas o futuro rei das ruas.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

寿司 Mad Sushi , 鮨

Eu conhecera Norma num bar, ou melhor, num sushi-bar, exatamente no Bad Sushi . Bad Sushi, era um pequeno, mas requintado restaurante japonês. Evidente, os orientais, donos do estabelecimento, pareciam não mais acreditar na velha fórmula de ganhar dinheiro. Talvez a tradição não mais contasse com pontos a seu favor. Talvez aquele ritual de deixarmos nossos ocidentais sapatinhos à entrada e desfilarmos de meias coloridas fosse coisa tão arcaica e prejudicial tanto quanto os rótulos de antibióticos vencidos. Portando, abandonado o velho costume o piso de tábuas largas abrigava perfeitamente os sons dos nossos sapatos, distinguindo o andar do homem ao da uma mulher pelo baque  grave e pesadelo nele e agudo e um tanto agudo nelas e nos seus indiscretos saltos 10. Porém, inovações à parte, não seria aquela a única quebra de protocolo. Havia também músicas em uma dezena  de pequenas caixas acústicas dispostas logo abaixo do teto,  um autêntico desfile pop dos dinossauros da década de 60, como  Frank Sinatra,  Ray Charles e Tony Bennett. Disperso ante tantas inovações foi que travei meu primeiro contato com Norma. De caraeu podia perceber  que era notívaga, principalmente diante daquela sua postura reflexiva, filosófica, sentada ali na mesa 38, acompanhando impassível os meus passos que foram ao seu encontro para servir o que nos pedira; sashimi à moda do Nobo; um refinado prato composto à base de filé de linguado, sementes de gergelim, cebolinha verde e gengibre.

- Parece assustadoramente apetitoso! – Exclamou ao abandonar sua inércia e me observar colocando sobre o tampo de madeira um enorme prato de louça branca adornado na borda com dois grossos filetes dourados.

-Ah sim, senhora! Também est[á me  parecendo  bom – Respondi diante da sua surpreendente simpatia.

Assim que a iguaria repousou na mesa Norma preencheu uma outra taça de um  bordeaux tinto e encorpado. Talvez ela estivesse com problemas sérios, posto que intercalava o vinho com doses generosas de sake.
E aquilo me preocupava - Será que no meu segundo dia de serviço me reservaria bêbados pela frente? – Me perguntei – Afinal aquela mulher sorvera mais de meia garrafa de vinho e outras tantas doses de sake entre o tempo da feitura do prato.

-Rapaz! Sabia que você tem lindos olhos azuis? Qual é o seu nome, menino?– Exclamou. Provavelmente se rendia ao efeito da bebida; os meus olhos eram verdes da cor das esmeraldas. Em todo caso quem era eu para contrariá-la?

-Não, não sabia! Obrigado, senhora! O meu nome é Adamastor– Agradeci gentilmente - Fora assim que eles me orientaram: seja amável com os clientes, Sempre um “muito obrigado” “pois não, senhor, pois não, senhora” “ boa noite, senhor, boa noite, senhora”.

Evidente, eu devia tirar proveito da minha boa aparência, provável motivo de minha contratação e me firmar mais que nunca naquele emprego, já que o dono da pensão onde eu morava ameaçava-me com despejo pelos três meses de aluguéis em atraso.

-Hum, como você me chamou? Você disse Senhora? Há alguma Senhora aqui? Nossa Senhora? Vê algum Jesus em meus braços? – Definitivamente ela  estava a caminho da alcoolização, fora  o fato de odiar que eu a tratasse por “senhora”.

Em seguida olhou para aquela culinária refinada e  retirou os malditos “pauzinhos” da fina embalagem que os protegiam de bactérias, e com maestria no uso dos dedos tentou manipular os alimentos.
Nada me restou a fazer se não ficar próximo, estático,   observando algo que começava ficar engraçado,  embora eu não pudesse demonstrar: Apesar da destreza, o seu estado de embriaguês não permitia um diálogo saudável  entre ela e sua alimentação; ora os pauzinhos iam para um lado, ora os pedaços de sushi rumavam para outro, semprec onflitantes.

-Ah merda, “A”...! “A” o que mesmo? – Perguntou-me nervosa e com olhos de louca

-Adamastor, senhora! Adamastor.

-Adamastor, não quero mais saber dessa merda! Peixes me dão muito trabalho. Isso ta me parecendo uma pescaria. Só que ao invés de anzóis são esses malditos palitos imensos - Exclamou e  empurrou desajeitadamente o prato para o seu lado direito.
 
-Adamastor, por favor, tome conta do meu casaco que vou ao toillet.

-Sim senhora!

-Quer saber que vou fazer no toillet, heim Adamastor?

-Não não! Claro que não, senhora!

-Puta que pariu! Lá vem tu com essa merda de senhora...Nossa Senhora, novamente?
Estou com Je.. – Ela não precisou terminar, eu já sabia da estória.

-Não! Não senhora. Não estou vendo nenhum Jesus Cristo em seus braços, senhora!

-Ah que bom! Pelo menos alguma percepção você têm! – Norma exclamou alto para depois cair numa estúpida gargalhada.

Aiaiaiaiai, meu Jesus! É hoje! – Murmurei quase silencioso comigo mesmo –
Graças ao bom Deus ela era um de nossos últimos clientes, já que estávamos a menos de uma hora de fechar o estabelecimento.
Norma se levantou tentando aparentar alguma altivez. Claro, lá estava uma belíssima mulher dos seus 40 e poucos anos. A sua beleza, refinada, seus olhos negros, os cabelos densos e a pele suave, dessas mantidas com cosméticos importados tornavam-na algo marcante naquele pequeno reservado. O taieur negro, de uma classe irretocável, caia-lhe esplendidamente bem no corpo da ainda dama de cintura  fina e pernas bem torneadas. Os seios, talvez um 44, me encheriam as mãos e me pareciam redondos e firmes.
Ereta, aspirou fundo e caminhou passo após passo. No início, insegurança, depois, milagrosamente seguiu  em linha reta  na direção do toillet feminino.
Nesse intervalo de sua ausência  desloquei-me pela redondeza servindo algo aqui, outro ali quando o rapaz do balcão me chamou com um sinal. Fui para próximo dele e ele, assim como se confessando  suas perversões  puxou-me delicadamente pela camisa.

-Adamastor, você não faz a menor idéia da grana que essa dona tem! O nome dela é dona Norma e está sempre por aqui, vip, cara! – Lady Di sussurou-me afetadamente no ouvido. Di, era assim que o tratávamos;.. Na verdade, Cesar Augusto, nosso barman, loiro oxigenado, homossexual resolvido e bem assumido.
 
-É mesmo? – Questinei sem muito interesse. Eu mantinha os olhos fixos pelo corredor  que dava aos banheiros. Aquela sua demora  me preocupava; e se a mulher tivesse fosse uma suicida? Ou se tivesse cravado o alicate de cutículas bem no meio do coração? E se fosse  epilética?  Por fim,  ela se encontrava trancada  por  lá há mais de 15 minutos!

Para o alívio,nem  tive tempo de continuar tagarelando com Lady pois Norma acabava de sair do toillet vindo em nossa direção. Surpreendentemente o seu andar agora era firme, reto e tinha estilo. Parecia até que algo de muito estranho aontecera no toillet para ela aparentar estar tão bem.
Assim que passou por nós sorriu-me levemente e se encaminou para o  reservado, sentando-se à mesa
Eficiente que era  fui ao encontro da minha cliente.

-“A”, “A” Adamastor, por favor, poderia me trazer a conta?

-Claro, pois não, senhora!

-Senhora, Nossa Senhora? Puta que pariu! Será que... – Não a deixei terminar

-Desculpe, desculpe dona Norma! É a força do hábito – Ela me olhou aturdida, talvez por eu ter pronunciado o seu nome.

Foi então que me pareceu prudente esclarecer que o barman havia dito quem era ela: Dona Norma, uma cliente Vip e muito considerada por todos que trabalhavam ali.
Normal sorriu com algum desdém diante das minhas explicaçõe ; Mediante à sua reação questionei-me se as mulheres odiavam verdades absolutas.
Assim, após o detalhamento  sai à cata da sua conta, e pelo canto dos olhos pude perceber que ela ainda me abservava. Porém, algo de estranho agia em mim: por mais eu procurasse desvencilhar meus olhares para outros lugares, fatalmente eles se encerravam na sua presença. De volta do caixa e com a conta descansando numa magnífica carteira de couro avermelhado fiz um leve aceno com a cabeça e entreguei-a em mãos. Ela apena passou o olhar pela comanda,  abriu sua bolsa de um couro mesclado de verde com rajadas levemente enegrecidas, e o que me fez supor que talvez alguma sucuri ou jacaré tivessem pagado aquele luxo todo com a própria existência. Lembro que ainda permaneci com o olhar fixo naquela selvagem excentricidade  e imaginando se dois anos  do meu  trabalho seriam suficientes para adquirir uma peça daquelas.
Ela, por sua vez acabava de escolher o cartão mais apropriado e o colocou em nossa carteira. E foi justamente neste trajeto da mesa até  o caixa que pude lhe saber o verdadeiro nome: Norma Magalhães Albuquerque – Óbvio, um nome pomposo para uma mulher  majestosa.
Voltando, entreguei-lhe as vias de díbito enquanto ela ainda me fitava atentamente. Assinadas, entregou-me a nossa via e  recolocou a sua via dentro da  sua carteira de grife sem não antes retirardela  uma nota de 100 reais. Era a minha  gratificação extra.
A sua generosidade   me surpreendeu - Era apenas o meu 2º dia de serviço eu ganhava uma nota de 100 pratas! Uau! Delirei-  Em todo o caso ela procurou ser discreta ao colocar a nota sob asua  taça de vinho para que eu a apanhasse.

-Obrigado! Muito obrigado senh... – Lembrei-me da sua raiva e abortei  de imediato – Quero dizer; Muito obrigado dona Norma! –

- Você fez por merecer, A....A.... – Ela, novamente às voltas com meu nome. E então pareceu recordar:

-Ah, é mesmo! Adamastor! Lembrei-me! – Ela disse ao se levantor. Ainda sorridente  deu às costas para mim:  Como era de se esperar ela aguardava que eu colocasse o casaco de peles sob os seus ombros.
Colocado, despediu-se e então saiu. Assim que se foi deixou o ar impregnado da sua existência e daquele   perfume francês que, provavelmente  custaria mais que o 13º salário do ano. E  mesmo partindo eu ainda procurava pelo seu aroma na atmosfera como se  fosse a sensibilidade de um peixe clamando por oxigênio  na ponta de um anzol.

Decorridos exatos 20 minutos eu estava à porta da saída de serviço a caminho de casa.
A madruga,  nebulosa e fria fazia  minhas narinas esfumaçarem e isso me dava a medida certa que eu teria que me esforçar naquele emprego para juntar uma grana e comprar ao menos um Uno 83. Sem o carro, mas com 100 reais no bolso da jaqueta caminhei reto na direção do ponto de ônibus onde eu teria de esperar mais de 40 minutos até o coletivo passar e me levar para o Parque Dom Pedro, e de lá num outro que me deixaria próximo do meu quarto na zona leste. Bem,  era o meu segundo dia e eu estava com 24 anos, portanto teria que me acostumar.- Não há uma boa buceta que não mereça uma lubrificada  costumava dizer meu avô. Eu ri daquilo - que relação haveria entre uma buceta lubrificada e o meu trabalho? - Nenhuma, supus. Ainda achando graça do lance  segui pelo beco onde a neblina tomando os espaços para si parecia sugerir   uma noite de terror e vampiros.
Indo um pouco mais além surpreendi-me com algo negro estacionado no meio da cerração. Repentinamnete ele foi ligado e um ronco poderoso se fez ouvir.
Repentinamente o  sileêncio. Mais próximo agora eu conseguia vislumbrar o automóvel  e perceber uma mulher sair pelo lado do motorista. A cena me pareceu tão espetacular que não estranharia se ela fosse nada mais, nada menos que Nossa Senhora Aparecida - Não era - Era Norma
Ela chegou perto de mim e me juntou pela jaqueta Lee. Nos lábios um sorriso  selvagem, malígno.

-Adamastor, você já dirigiu um desses? - Olhei-a aturdido.

-Já, já sim, dona Norma – Ela se referia à sua Mercedes-Benz Classe M – Um esporte utilitário de alto luxo.

-Dirigiu? E como poderia ter dirigido um carro desse? – Perguntou-me incrédula.

-Ah! Isso foi há quatro meses atrás. Eu era manobrista num estacionamneto da Av. Brasil.

-É mesmo? Puxa! Então é seu dia de sorte! – Em seguida concluiu:

-Então é isso, Adamastor! To precisando de um motorista! Início imediato! Casa, salário e comida. Não te parece bom ? – Perguntou-me naquele olhar insano enquanto feria meu lábio inferior.

Eu quase podia sentir a umidade de sua língua à milímetros da minha, e a sensação era muito boa e o cheiro exalado por ela me parecia dessas feras reféns do cio. Correspondendo, empurrei a língua forçando a passagem por entre seus dentes. Foi lá que encontrei a sua a língua, úmida,  viscosa e ainda com gosto de álcool. Ao se encontrarem, ambas se arremeteram  numa luta insana, como se cobras  furiosas em luta de morte pela supremacia do território. Por detrás das suas costas escorreguei as minhas mãos até se firmarem na curvatura do seu traseiro; havia carne boa e rija  ali. Excitado, subindo uma das mãos para um dos seios senti meu pau eriçar-se como se fosse o mastro desfraldando vela à caça de ventania.
Eu não sabia quanto tempo poderia durar aquilo tudo, mas sabia que nesse mundo havia loucos de todos os tipos. Talvez Norma fosse somente  mais uma. Talvez eu também fosse outro débil mental. Quem haveria de saber?
Ainda quando atracados  pude sentir os seus  sussurros, para depois gemer e grunhir: “ Vem aqui meu cachorrinho! Vem cá meu putinho!

Recompostos, mas com o tesão latejando no meio das pernas de cada ser ela jogou as chaves do carro na minha mão e eu sentei no banco de um couro sofisticado e macio. Suavemente deslizei a mão pela sua textura o suficiente para sentir-me pleno da sensação de nobreza.
Dada a partida  a Mercedes rugiu novamente, repleta de classe e de estilo. Norma, ao meu lado parecia estar feliz  e olhos profundamente negros me olhavam como nunca. No banco do passageiro,  com uma das mãos ela alisava a minha perna direita enquanto a outra tentava encaracolar os meus lisos cabelos.
Talvez fosse somente carinho de fêmea e eu gostava daquilo apesar de saber que jamais eles se tornariam cacheados
Acendi os faróis e eles alumiaram a tão longe que me deu  a impressão que poderiam refletir no horizonte.
Com os olhos fixos naqueles divinos  fachos de luzes  o silêncio me veio e eu rezei  pra Deus e lhe perguntei  o porque daquilo estar acontecendo daquela forma, se não era uma brincadeira ou mera gozação. Imbecilizado, mantive-me por completo silêncio como se auardasse a sua resposta. Nada! parecia que Deus não estava a fim de muito papo.
Sai do transe e ajustei o câmbio automático para um melhor desempenho quando  uma voz poderosa esbravejou em meus ouvidos. Norma, infantilmente  continuava encaracolando meus cabelos sem demonstrar qualquer surpresa ou do conhecimento de alguma voz. Para mim ficara claro; Só a mim fora dirigida a palavra: " Foi assim porque ela te elegeu,  Mané!"

Eu gargalhei alto, escandaloso,  enquanto Norma me olhavasem nada compreender.
Deus tinha dessas coisas;Vez ou outra me fazia sorrir.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

A empregada


-Seu China?

-Sim, pois não, Noêmia!

-Ah...é que preciso de um aumento..

-Como? - Engasguei

-Eu disse, preciso de um aumento. Um aumento substancial, seu China! - Ela rebate sem despregar os olhos de mim

-Sub o que? – Pergunto incrédulo

-Substancial, seu China! Vou repetir; Um aumento substancial ! –  Sim! Foi o que Noêmia exclamou a bordo daqueles esplendorosos olhos quase negros que,  por volta do ½ dia sempre cintilaram castanhos. Isso foi à coisa de seis meses

E ainda lembro que, após a reivindicação, olhou-me algo enviesado enquanto abandonava o meu quarto ajeitando sua saia nos quadris,  balançando a bunda carnuda e bem feita, mas em fim de fase balzaciana. Mais uma vez o China era pego de sopetão, ali, sentado aos pés da cama observando suas meias  ¾, na cor branca, escondendo o constrangimento de algumas veias azuladas.

Quanto ao pedido de Noêmia, ele se dava no decorrer do seu segundo mês de trabalho.
Recordo que o pedido me deixou macambúzio por alguns dias. À época pensei; Qual será o próximo passo? Executar-me por exploração sexual?  Me ferrar diante dum juiz?  Justo eu a tomar um xeque mate dum par de coxas bem torneadas?

Recordo também que, não lhe dei a resposta de pronto, e ela rumou para a cozinha e ficou batendo panelas,  propositadamente. Naquele instante pensei muito e me questionei se  aquele não fosse o melhor momento para desistir das minhas comodidades, reconsiderar a possibilidade de voltar a arrumar os meus lençóis, desengordurar as louças na pia, ou mesmo,  providenciar a faxina pesada no banheiro e na cozinha.
Recordo também que me livrei desses pensamentos, pois talvez nem devesse me preocupar aquilo,  mas sim deixar tudo empilhado pelos cantos, esquecendo-me dos odiosos trabalhos domésticos para dedicar-me aos meus DVDs de faroeste, e sair de espairecer, tomar um ar, desafiar os velhotes do bairro no jogos de damas, ali, naqueles concretados bancos do parque municipal.

Claro, sei que a casa ficaria uma balbúrdia como se a bomba atômica tivesse explodido dentro dela, afinal, são raríssimos os homens que conseguem dar cabo das tarefas domésticas. Entretanto,  tudo para mim poderia ser mais fácil, mas, teimoso, sempre houve comigo a questão das mulheres e dos relacionamentos.
E afirmo porque as mulheres sempre redundaram  em exercícios de expectativa, pois com elas tudo se torna improvável, já que apresentam resultados conflitantes para uma mesma equação. Sim, elas queimam rápido, imprevisíveis, e talvez suas convicções durem apenas o tempo do acender e apagar o cigarro. 

Entretanto sei que reclamamos apenas da boca para fora, pois nós os homens fazemos das nossas e não somos diferentes. Se pudesse comparar, diria que somos os isqueiros triscados que se acendem nas misteriosas esquinas do mundo. Somos imprecisos e insípidos  como as chamas que neles bocejam. E mais; somos idênticos as fumaças de cigarro que,  abandonam as bocas para serpentearem e dissiparem na atmosfera sem que a humanidade se dê pelo desaparecimento.
Sim, e não há porque mentir; somos tão imprecisos e incalculáveis como a linha do horizonte, pois nela não há ponto de partida ou chegada.

Logo, vocês devem estar se perguntando: Sim, China, mas o que Noêmia tem a ver com tudo isso?
E eu lhes respondo; Nada, aliás, tudo! Pois fiz os cálculos e pedi Noêmia em casamento. Evidente... ela é uma boa mulher, e eu estou ficando velho.

Agora...ela continua entrando e saindo do meu quarto e ajeitando a saia nos quadris, mas ainda não deu resposta para o meu pedido.
Porém, o que me deixa danado da vida,  é que ela está sempre me questionando o aumento.