quarta-feira, 14 de abril de 2010

寿司 Mad Sushi , 鮨

Eu conhecera Norma num bar, ou melhor, num sushi-bar, exatamente no Bad Sushi . Bad Sushi, era um pequeno, mas requintado restaurante japonês. Evidente, os orientais, donos do estabelecimento, pareciam não mais acreditar na velha fórmula de ganhar dinheiro. Talvez a tradição não mais contasse com pontos a seu favor. Talvez aquele ritual de deixarmos nossos ocidentais sapatinhos à entrada e desfilarmos de meias coloridas fosse coisa tão arcaica e prejudicial tanto quanto os rótulos de antibióticos vencidos. Portando, abandonado o velho costume o piso de tábuas largas abrigava perfeitamente os sons dos nossos sapatos, distinguindo o andar do homem ao da uma mulher pelo baque  grave e pesadelo nele e agudo e um tanto agudo nelas e nos seus indiscretos saltos 10. Porém, inovações à parte, não seria aquela a única quebra de protocolo. Havia também músicas em uma dezena  de pequenas caixas acústicas dispostas logo abaixo do teto,  um autêntico desfile pop dos dinossauros da década de 60, como  Frank Sinatra,  Ray Charles e Tony Bennett. Disperso ante tantas inovações foi que travei meu primeiro contato com Norma. De caraeu podia perceber  que era notívaga, principalmente diante daquela sua postura reflexiva, filosófica, sentada ali na mesa 38, acompanhando impassível os meus passos que foram ao seu encontro para servir o que nos pedira; sashimi à moda do Nobo; um refinado prato composto à base de filé de linguado, sementes de gergelim, cebolinha verde e gengibre.

- Parece assustadoramente apetitoso! – Exclamou ao abandonar sua inércia e me observar colocando sobre o tampo de madeira um enorme prato de louça branca adornado na borda com dois grossos filetes dourados.

-Ah sim, senhora! Também est[á me  parecendo  bom – Respondi diante da sua surpreendente simpatia.

Assim que a iguaria repousou na mesa Norma preencheu uma outra taça de um  bordeaux tinto e encorpado. Talvez ela estivesse com problemas sérios, posto que intercalava o vinho com doses generosas de sake.
E aquilo me preocupava - Será que no meu segundo dia de serviço me reservaria bêbados pela frente? – Me perguntei – Afinal aquela mulher sorvera mais de meia garrafa de vinho e outras tantas doses de sake entre o tempo da feitura do prato.

-Rapaz! Sabia que você tem lindos olhos azuis? Qual é o seu nome, menino?– Exclamou. Provavelmente se rendia ao efeito da bebida; os meus olhos eram verdes da cor das esmeraldas. Em todo caso quem era eu para contrariá-la?

-Não, não sabia! Obrigado, senhora! O meu nome é Adamastor– Agradeci gentilmente - Fora assim que eles me orientaram: seja amável com os clientes, Sempre um “muito obrigado” “pois não, senhor, pois não, senhora” “ boa noite, senhor, boa noite, senhora”.

Evidente, eu devia tirar proveito da minha boa aparência, provável motivo de minha contratação e me firmar mais que nunca naquele emprego, já que o dono da pensão onde eu morava ameaçava-me com despejo pelos três meses de aluguéis em atraso.

-Hum, como você me chamou? Você disse Senhora? Há alguma Senhora aqui? Nossa Senhora? Vê algum Jesus em meus braços? – Definitivamente ela  estava a caminho da alcoolização, fora  o fato de odiar que eu a tratasse por “senhora”.

Em seguida olhou para aquela culinária refinada e  retirou os malditos “pauzinhos” da fina embalagem que os protegiam de bactérias, e com maestria no uso dos dedos tentou manipular os alimentos.
Nada me restou a fazer se não ficar próximo, estático,   observando algo que começava ficar engraçado,  embora eu não pudesse demonstrar: Apesar da destreza, o seu estado de embriaguês não permitia um diálogo saudável  entre ela e sua alimentação; ora os pauzinhos iam para um lado, ora os pedaços de sushi rumavam para outro, semprec onflitantes.

-Ah merda, “A”...! “A” o que mesmo? – Perguntou-me nervosa e com olhos de louca

-Adamastor, senhora! Adamastor.

-Adamastor, não quero mais saber dessa merda! Peixes me dão muito trabalho. Isso ta me parecendo uma pescaria. Só que ao invés de anzóis são esses malditos palitos imensos - Exclamou e  empurrou desajeitadamente o prato para o seu lado direito.
 
-Adamastor, por favor, tome conta do meu casaco que vou ao toillet.

-Sim senhora!

-Quer saber que vou fazer no toillet, heim Adamastor?

-Não não! Claro que não, senhora!

-Puta que pariu! Lá vem tu com essa merda de senhora...Nossa Senhora, novamente?
Estou com Je.. – Ela não precisou terminar, eu já sabia da estória.

-Não! Não senhora. Não estou vendo nenhum Jesus Cristo em seus braços, senhora!

-Ah que bom! Pelo menos alguma percepção você têm! – Norma exclamou alto para depois cair numa estúpida gargalhada.

Aiaiaiaiai, meu Jesus! É hoje! – Murmurei quase silencioso comigo mesmo –
Graças ao bom Deus ela era um de nossos últimos clientes, já que estávamos a menos de uma hora de fechar o estabelecimento.
Norma se levantou tentando aparentar alguma altivez. Claro, lá estava uma belíssima mulher dos seus 40 e poucos anos. A sua beleza, refinada, seus olhos negros, os cabelos densos e a pele suave, dessas mantidas com cosméticos importados tornavam-na algo marcante naquele pequeno reservado. O taieur negro, de uma classe irretocável, caia-lhe esplendidamente bem no corpo da ainda dama de cintura  fina e pernas bem torneadas. Os seios, talvez um 44, me encheriam as mãos e me pareciam redondos e firmes.
Ereta, aspirou fundo e caminhou passo após passo. No início, insegurança, depois, milagrosamente seguiu  em linha reta  na direção do toillet feminino.
Nesse intervalo de sua ausência  desloquei-me pela redondeza servindo algo aqui, outro ali quando o rapaz do balcão me chamou com um sinal. Fui para próximo dele e ele, assim como se confessando  suas perversões  puxou-me delicadamente pela camisa.

-Adamastor, você não faz a menor idéia da grana que essa dona tem! O nome dela é dona Norma e está sempre por aqui, vip, cara! – Lady Di sussurou-me afetadamente no ouvido. Di, era assim que o tratávamos;.. Na verdade, Cesar Augusto, nosso barman, loiro oxigenado, homossexual resolvido e bem assumido.
 
-É mesmo? – Questinei sem muito interesse. Eu mantinha os olhos fixos pelo corredor  que dava aos banheiros. Aquela sua demora  me preocupava; e se a mulher tivesse fosse uma suicida? Ou se tivesse cravado o alicate de cutículas bem no meio do coração? E se fosse  epilética?  Por fim,  ela se encontrava trancada  por  lá há mais de 15 minutos!

Para o alívio,nem  tive tempo de continuar tagarelando com Lady pois Norma acabava de sair do toillet vindo em nossa direção. Surpreendentemente o seu andar agora era firme, reto e tinha estilo. Parecia até que algo de muito estranho aontecera no toillet para ela aparentar estar tão bem.
Assim que passou por nós sorriu-me levemente e se encaminou para o  reservado, sentando-se à mesa
Eficiente que era  fui ao encontro da minha cliente.

-“A”, “A” Adamastor, por favor, poderia me trazer a conta?

-Claro, pois não, senhora!

-Senhora, Nossa Senhora? Puta que pariu! Será que... – Não a deixei terminar

-Desculpe, desculpe dona Norma! É a força do hábito – Ela me olhou aturdida, talvez por eu ter pronunciado o seu nome.

Foi então que me pareceu prudente esclarecer que o barman havia dito quem era ela: Dona Norma, uma cliente Vip e muito considerada por todos que trabalhavam ali.
Normal sorriu com algum desdém diante das minhas explicaçõe ; Mediante à sua reação questionei-me se as mulheres odiavam verdades absolutas.
Assim, após o detalhamento  sai à cata da sua conta, e pelo canto dos olhos pude perceber que ela ainda me abservava. Porém, algo de estranho agia em mim: por mais eu procurasse desvencilhar meus olhares para outros lugares, fatalmente eles se encerravam na sua presença. De volta do caixa e com a conta descansando numa magnífica carteira de couro avermelhado fiz um leve aceno com a cabeça e entreguei-a em mãos. Ela apena passou o olhar pela comanda,  abriu sua bolsa de um couro mesclado de verde com rajadas levemente enegrecidas, e o que me fez supor que talvez alguma sucuri ou jacaré tivessem pagado aquele luxo todo com a própria existência. Lembro que ainda permaneci com o olhar fixo naquela selvagem excentricidade  e imaginando se dois anos  do meu  trabalho seriam suficientes para adquirir uma peça daquelas.
Ela, por sua vez acabava de escolher o cartão mais apropriado e o colocou em nossa carteira. E foi justamente neste trajeto da mesa até  o caixa que pude lhe saber o verdadeiro nome: Norma Magalhães Albuquerque – Óbvio, um nome pomposo para uma mulher  majestosa.
Voltando, entreguei-lhe as vias de díbito enquanto ela ainda me fitava atentamente. Assinadas, entregou-me a nossa via e  recolocou a sua via dentro da  sua carteira de grife sem não antes retirardela  uma nota de 100 reais. Era a minha  gratificação extra.
A sua generosidade   me surpreendeu - Era apenas o meu 2º dia de serviço eu ganhava uma nota de 100 pratas! Uau! Delirei-  Em todo o caso ela procurou ser discreta ao colocar a nota sob asua  taça de vinho para que eu a apanhasse.

-Obrigado! Muito obrigado senh... – Lembrei-me da sua raiva e abortei  de imediato – Quero dizer; Muito obrigado dona Norma! –

- Você fez por merecer, A....A.... – Ela, novamente às voltas com meu nome. E então pareceu recordar:

-Ah, é mesmo! Adamastor! Lembrei-me! – Ela disse ao se levantor. Ainda sorridente  deu às costas para mim:  Como era de se esperar ela aguardava que eu colocasse o casaco de peles sob os seus ombros.
Colocado, despediu-se e então saiu. Assim que se foi deixou o ar impregnado da sua existência e daquele   perfume francês que, provavelmente  custaria mais que o 13º salário do ano. E  mesmo partindo eu ainda procurava pelo seu aroma na atmosfera como se  fosse a sensibilidade de um peixe clamando por oxigênio  na ponta de um anzol.

Decorridos exatos 20 minutos eu estava à porta da saída de serviço a caminho de casa.
A madruga,  nebulosa e fria fazia  minhas narinas esfumaçarem e isso me dava a medida certa que eu teria que me esforçar naquele emprego para juntar uma grana e comprar ao menos um Uno 83. Sem o carro, mas com 100 reais no bolso da jaqueta caminhei reto na direção do ponto de ônibus onde eu teria de esperar mais de 40 minutos até o coletivo passar e me levar para o Parque Dom Pedro, e de lá num outro que me deixaria próximo do meu quarto na zona leste. Bem,  era o meu segundo dia e eu estava com 24 anos, portanto teria que me acostumar.- Não há uma boa buceta que não mereça uma lubrificada  costumava dizer meu avô. Eu ri daquilo - que relação haveria entre uma buceta lubrificada e o meu trabalho? - Nenhuma, supus. Ainda achando graça do lance  segui pelo beco onde a neblina tomando os espaços para si parecia sugerir   uma noite de terror e vampiros.
Indo um pouco mais além surpreendi-me com algo negro estacionado no meio da cerração. Repentinamnete ele foi ligado e um ronco poderoso se fez ouvir.
Repentinamente o  sileêncio. Mais próximo agora eu conseguia vislumbrar o automóvel  e perceber uma mulher sair pelo lado do motorista. A cena me pareceu tão espetacular que não estranharia se ela fosse nada mais, nada menos que Nossa Senhora Aparecida - Não era - Era Norma
Ela chegou perto de mim e me juntou pela jaqueta Lee. Nos lábios um sorriso  selvagem, malígno.

-Adamastor, você já dirigiu um desses? - Olhei-a aturdido.

-Já, já sim, dona Norma – Ela se referia à sua Mercedes-Benz Classe M – Um esporte utilitário de alto luxo.

-Dirigiu? E como poderia ter dirigido um carro desse? – Perguntou-me incrédula.

-Ah! Isso foi há quatro meses atrás. Eu era manobrista num estacionamneto da Av. Brasil.

-É mesmo? Puxa! Então é seu dia de sorte! – Em seguida concluiu:

-Então é isso, Adamastor! To precisando de um motorista! Início imediato! Casa, salário e comida. Não te parece bom ? – Perguntou-me naquele olhar insano enquanto feria meu lábio inferior.

Eu quase podia sentir a umidade de sua língua à milímetros da minha, e a sensação era muito boa e o cheiro exalado por ela me parecia dessas feras reféns do cio. Correspondendo, empurrei a língua forçando a passagem por entre seus dentes. Foi lá que encontrei a sua a língua, úmida,  viscosa e ainda com gosto de álcool. Ao se encontrarem, ambas se arremeteram  numa luta insana, como se cobras  furiosas em luta de morte pela supremacia do território. Por detrás das suas costas escorreguei as minhas mãos até se firmarem na curvatura do seu traseiro; havia carne boa e rija  ali. Excitado, subindo uma das mãos para um dos seios senti meu pau eriçar-se como se fosse o mastro desfraldando vela à caça de ventania.
Eu não sabia quanto tempo poderia durar aquilo tudo, mas sabia que nesse mundo havia loucos de todos os tipos. Talvez Norma fosse somente  mais uma. Talvez eu também fosse outro débil mental. Quem haveria de saber?
Ainda quando atracados  pude sentir os seus  sussurros, para depois gemer e grunhir: “ Vem aqui meu cachorrinho! Vem cá meu putinho!

Recompostos, mas com o tesão latejando no meio das pernas de cada ser ela jogou as chaves do carro na minha mão e eu sentei no banco de um couro sofisticado e macio. Suavemente deslizei a mão pela sua textura o suficiente para sentir-me pleno da sensação de nobreza.
Dada a partida  a Mercedes rugiu novamente, repleta de classe e de estilo. Norma, ao meu lado parecia estar feliz  e olhos profundamente negros me olhavam como nunca. No banco do passageiro,  com uma das mãos ela alisava a minha perna direita enquanto a outra tentava encaracolar os meus lisos cabelos.
Talvez fosse somente carinho de fêmea e eu gostava daquilo apesar de saber que jamais eles se tornariam cacheados
Acendi os faróis e eles alumiaram a tão longe que me deu  a impressão que poderiam refletir no horizonte.
Com os olhos fixos naqueles divinos  fachos de luzes  o silêncio me veio e eu rezei  pra Deus e lhe perguntei  o porque daquilo estar acontecendo daquela forma, se não era uma brincadeira ou mera gozação. Imbecilizado, mantive-me por completo silêncio como se auardasse a sua resposta. Nada! parecia que Deus não estava a fim de muito papo.
Sai do transe e ajustei o câmbio automático para um melhor desempenho quando  uma voz poderosa esbravejou em meus ouvidos. Norma, infantilmente  continuava encaracolando meus cabelos sem demonstrar qualquer surpresa ou do conhecimento de alguma voz. Para mim ficara claro; Só a mim fora dirigida a palavra: " Foi assim porque ela te elegeu,  Mané!"

Eu gargalhei alto, escandaloso,  enquanto Norma me olhavasem nada compreender.
Deus tinha dessas coisas;Vez ou outra me fazia sorrir.

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