sexta-feira, 11 de junho de 2010

De Las Vegas à Madrid.

Las Vegas, cassinos, o The Bellagio o mais famoso deles. Sábado à noite, sorte, muita sorte. A roleta gira  magnetizada por sua presença,  pelo bafejo morno que   abandona a sua boca para que esquente as mãos.

A noite persiste gélida, porém,  há a sorte, muita sorte para aquele sábado. Ao seu lado, como se fosse Marilyn Monroe,  a vadia  dos três últimos anos dependura-se  em seu pescoço e lhe  mordisca a orelha. Seus cabelos  platinados mergulham numa das  metades do rosto enquanto a   língua de  mil lambidas tenta sorver as últimas gotas do dry martini umificado nos os lábios dele.

A roleta gira, frenética, e a platéia delira. Mais um jogo ganhador?  Simplesmente ainda não há como  saber.

- Tudo no vermelho 7, seco! – Ele dita para o homem da banca  –

Seco, significa  que se a jogada for vencedora pagará  um prêmio  na proporção de  35 dólares para cada dólar apostado. São trinta e cinco chances contra a  misericórdia de uma única a seu favor. Apesar de  menor o  risco ele evita um Split de 17 x 1 como nas vezes anteriores -

Ele se recorda que ao amanhecer olhou pela janela do quarto de hotel e vislumbrou  um esplendoroso tapete de gramas verdes seguindo ao pé da colina até derramar-se  no topo com o azul do céu.
Levantou o olhar e o sol cintilava magnânino e turvava suas vistas. Apesar disto sentiu-se sereno. Repentinamente  pareceu ouvir sussurros vindos de algum lugar e eles pareciam dizer: "É o seu dia, cara! Hoje é seu grande dia!" - Debruçou-se sobre o peitoril e inspecionou a janela do quarto ao lado. Nada. Voltou para o interior  e nada viu ou ouviu que não fosse  Jannie ressonando pesadamente por debaixo dos lencóis. "Devo estar ficando louco" - admitiu.

O ocorrido na parte da manhã lhe perseguira por todo o dia.  Agora  lá está ele no Bellagio, às quase duas  da madrugada com um pouco menos de meio milhão de dólares  no bolso  - O delírio não  mentira. Era o seu dia de sorte -
Olhou para as fichas que se debruçavam sobre a banca e flertou novamente a roleta.

-Hoje, nada me detém! Vamos homem! Ouviu o que eu disse? Todas as fichas no vermelho 7!

Murmúrios de surpresa ecoam próximos. Indiferentes, alguns persistem nas  mesas de carteado e nas máquinas de caça níqueis, onde,  fracassados,  punemente perdem seus valores.

-Gira Roda! Gira! – Gritam os covardes que não teriam culhões para uma aposta deste tipo.

Jannie rebolando a mágica bunda e esfrega-se na calça do amante postado atrás de si. Ele, devasso, desce a mão pela curvatura do seu rabo e  lhe dá duas palmadinha.
Fichas de todas as cores contrastam com a tonalidade verde musgo do veludo – Matar ou morrer – Diz para si ao ver a roleta em ação - Roda! Roda – Gritam os que torcem contra ou pró.
Alguns segundos e a física prevalece e a roleta perde a força. Mais outros e os giros se tornam lentos, quase inertes  - 36, 1, 2, 3, 4, 5, 6 – A bolinha pulula de casa em casa como se carregasse brasas nos sapatos. Indecisa, ela ameaça não invadir  a  casa do vermelho 7 porém.  Na dúvida,  não resiste e invade.

- Ganhei! – O apostador explode num grito - Ganhei! - Repete flexionando os braços num vai e vem como se estivesse copulando.

Vencedoras, as fichas o encaram e parecem lhe dizer:  É tudo teu, papai!  13 milhões de dólares! É o topo do mundo!

Surreal, ele ainda não crê quando abraça a centena de peças coloridas  - Alguem seria capaz de prever 10 mil   transformando-se em 13 milhões de dólares? –  Jamais! Somente ele e as mais de três horas em que permaneceu com o olhar devotado para aquela roleta  - Decerto, Cristo não teria feito melhor mesmo que  multiplicasse um milhão de pães – Concluiu descomedido.

Ao lado a insana Jannie emitia gritos estridente, horríveis, e que inexplicavelmente terminavam graves, seguidos de uma espécie de quizo, como se cascavel pronta para dar o bote. E ela,  depravada, já não se importava com  as atitudes ou com algum bom senso, tanto que no meio daquela gente  roçou-se com mais vigor no seu homem. Não contente, vigorosamente apertou-lhe as bolas do saco.
Ele sentiu  a  pressão dos dedos e gemeu com alguma dor; “aiii, putinha”  - Queixou-se cafajeste.
Ela o olhou com desdem e gargalhou, alto – Afinal, com essa grana, etiqueta pra que?

A poucos metros dali uma bela mulher o olhava fixamente. Ela flertava o alinho do seu  smoking e com as abotuaduras de ouro 18,  cravejadas de duas esmeraldas triangulares  – Mais que nunca ele lhe  pareceu uma divindade –
Contudo, de costas, ele não a percebeu.
A moça dos lindos olhos negros, um tanto  ansiosa  lançou o olhar na direção da própria mão esquerda e se certificou se ainda ela encontrava-se  la. Sim, estava la a aliança de brilhantes que a pouco menos de dois meses o seu deus havia a presenteado pelo quinto aniversário de casamento.   Se tratava de uma peça de valor relativo, mas o importante não era exatamente o seu valor e sim um casamento de cinco anos que ela julgava ser feliz - Mero engano, não era. Outro angano;  Outro engano; estava em viagem de negócios. E finalmente o pior deles; não sabia de Jannie.

Portanto, assim que seus olhos negros  voltaram à  realidade  se confundiram com coloração daquele smoking, vindos impregnados de um brilho inusual, misterioso –
Calmamente ela retira alguma coisa de sua bolsa de pouco mais de 100 dólares. Algo reluzunte a prateado  desafia o espaço e o estampido ecooa, obrigando algumas pessoas se atirarem ao chão. O projétil vara o espaço e penetra  por trás, no meio de sua cabeça. -  Para ele não haveria perigo  algum se aquele calibre 22 estivesse  a  uma distância  relativamente maior, porém ele permanecia tão próximo, tão à mão...
O impacto o fez desabar. No chão,   o seu refinado smoking  era tomado e tingido  por um líquido rubro,  viscoso,  que, escorrendo pela nuca desbrava um trajeto no chão. - O tiro  fora certeiro e mortal –
Apaixonada ela o olhou estirado ao chão. Ela admirava seus cabelos grisalhos e o ar feudal daquele homem bonito. Diante de olhares atônitos ela circuncou o seu corpo; agora ele mais se assemelhava a  um toureiro golpeado de morte por touro de Mourão.

Jannie, deparavada,  permaneceu gritando, guizando até o derradeiro suspiro do homem.

A banca havia sido quebrada.

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