terça-feira, 26 de julho de 2011

Álbum de Fotografias - Uma quase estória de amor -


Perdido nos labirintos dos meus medos/ Quero ser  água de cachoeira/ Desprender-me do alto e jorrar/ Num voo livre e denso/ Sentir a força deste amor/ Em cada sorriso do teu olhar/ Não vou  mais me arrebentar/ Em pedras de sabores amargos........
Foi o que jurei para mim


Era uma poesia minha. Uma poesia à procurava de algum rosto, algum traço que pudesse trazer  alegria e um motivo de fazer persistir-me nesse acordar do dia-a-dia,  nessa vida de tantos tropeços. Eu andava numa solidão de dar dó, auto-imposta, premeditada até. Afinal,  nada surgia que me interessasse à ponto de fazer desprender-me da concha para perceber o que se passava à minha volta. Deixados para trás  ficaram  dois casamentos, mulheres, alguns fracassos, e filhos. Aliás, uma penca deles, cinco para ser mais exato, esses sim jamais “ex”..
Recordo também que esta solidão foi colocada em xeque na Rua Barão de Itapeteninga, no centro de Sampa. No meio da multidão um rapaz  gritava os dizeres de um cartaz preso às costas: "Case bem e deixe essa vida de vai-e-vem!" Evidente, achei muito engraçado a cena. Porém algo curioso aconteceu ao olhar praquele  garoto. Repentinamente me senti impulsionado a ir no endereço indicado, um pressentimento que  pudesse dar certo. Memorizei o destinoo e na mesma rua, no 318, conjunto 301- achei a agência de csamentos - CASE BEM -
Ansioso, subi ao 3o andar e fui ao encontro da minha felicidade.
Ao adentrar ao conjunto uma moça de cabelos avermelhados me olha de cima abaixo:

-Boa tarde, senhor....senhor...

-Oh, desculpe, Kelldian! Marco Kelldian – Respondi.

-O Senhor está á procura da felicidade? – Ela me pergunta com certa doçura na voz.

Tive vontade de responder que  jamais existiu e nem existiria a felicidade e essa tal pessoa ideal. Talvez eu estivesse sendo um tanto radical pois numa  certa vez alguém cruzou o meu caminho. Uma dessas pesssoas fabulosas e que temos por hábito de rotular por "sob medida”  Contudo, e contrariando o outro lado da moeda ela percebeu à tempo que eu não era a medida para o seu tamanho.

Todavia achei melhor não contrariá-la  em demasia. Eu não queria parecer-lhe antipático.

-Sim! Estou à procura da felicidade, senhorita.....

-Carla! Carla Dambrózio – Respondeu caprichando ainda mais no sorriso comercial.

Ela puxou uma cadeira e pediu para sentar-me. Ainda com naquele sorriso forçado deu-me a ficha cadastral onde eu deveria fornecer meus dados pessoais, situação sócio-econômica e outros tantos detalhes que por pouco imaginei estar ante um fiscal da Receita Federal. Após preenchido ela faz um recibo e me entrega. Retiro o talão de cheques da carteira e preencho a penúltima folha com a quantia solicitada.

Ao entregar-lhe o cheque  imaginei se aqueles trezentos reais seriam um indício para minha felicidade. Era mais que certo na vida sempre será necessário pagar pra ver, portanto, eu estava fazendo a minha parte. E também porque se fosse bem sucedido  naquela louca procura haveria de concordar; o preço era irrisório.

Em seguida levantou-se da sua mesa e me encaminhou para uma das diversas salas do conjunto. Ali numa delas colocou alguns álbuns de fotografias sobre uma mesa de reunião.

-Senhor Kelldian, aí estão as fotos de algumas de nossas mulheres Aquelas que ainda no encontram a sua cara metade.

Dito, novamente sorriu o seu melhor sorriso empresarial, encostou a porta e deixou-me só. - “Nossas mulheres” - O termo ecoava em minha mente. “Nossas mulheres..nossas mulheres” - Eu estava impressionado pelo fato delas custarem tão barato...apenas trezentos reais – Concluí.

Na mesa três volumes de álbuns. Abri pacienciosamente e no primeiro percebi algumas mulheres interessantes, bonitas até. Eu achei curioso o fato de todas as fotos apresentarem o mesmo fundo, uma paisagem de nuvens límpidas e um céu extremamente azul. Isso me levou a deduzir  que as fotos eram tiradas ali mesmo, provavelmente em alguma daquelas salas.

Em todo caso o passe de mágica veio com o segundo álbum. La estava ela! Eu achara!
Eduarda Reys indicava o nome na contracapa do seu pequeno book. A descrição do seu perfil indicava para um cargo de assistente social. Além de divorciada dizíasse poetisa. Logo mais adiante fazia menção à dois filhos ainda menores. Algo me apaixonava nela e naqueles olhos tão cheios de vida. Um sorriso repleto de esperanças me fez imaginar campos verdejantes, calor das mãos dadas e sussurros de eterno amor.
Nas fotos mais à distância notava-se um corpo de alguém beirandos aos  quarenta, porém de curvas excitantes e pernas bem torneadas. Tudo isso se emoldurava num vestido dum vermelho Ferrari com  5 dedos acima dos joelhos.
Claro, o entusiasmo evitou  que eu perdesse  tempo com os demais álbuns.
Levantei e me encaminhei à recepção.

-Senhorita Dambrózio, eu a encontrei!

-Um minuto senhor Kelldian. Já vou vê-lo e conversamos melhor. – Ela respondeu ao interromper a ligação em que estava.

Menos de 5 minutos la estava a recepcionista me indicando de que forma  proceder.
Sobre a pessoa em questão a senhorita Dambrozio relatou que a "dona Eduarda" preferiria ver antecipadamente  as fotos do eventual pretendente. E no caso de manter algum interesse, que o contato seria feito pela própria e por  telefone.

- Tem certeza que há o interesse, Senhor Kelldian?

-Plenamente! Todo interesse – Concluí mais palavras.

A senhorita Dambrózio sorriu e pediu para acompanhá-la, novamente. Mais uma vez eu me via perdido naquele labirinto de salas quando entramos noutra delas. E foi  lá, sob a limpidez de nuvens alvas e dum céu cretinamente azul que tirei as fotos para o meu book.  Era estranho. Repentinamente eu me sentia uma espécie de top model - "Vire mais pra ca, pra lá, sorria, não franza a testa" - Ela orientava a mim e ao meu constrangimento.
Por sorte eu havia me barbeado na manhã  e minha aparência, complementada por um terno social  de um cinza escuro e uma camisa branca me aferiam um certo ar de respeitabilidade.

-Bem....É só isso senhorita? – Perguntei. Além de me sentir incomodado achava estranho todas aquelas formalidades – Pensei - . E o amor, eim? Bem...o amor.. quem diria... o amor tinha se tornado mera transação comercial, um grande negócio.

-Sim, é sim, senhor Kelldiam.  Aguarde que manteremos contato. Telefonaremos, avisou no final.

Despedimo-nos cordialmente e retornei para casa com o sorriso de Eduarda impregnado na mente. A senhora Reys impressionara, sensivelmente.
Nos dois dias seguintes  não me dispersara do seu olhar quando o telefone toca.

-Alô, o senhor Kelldian, por favor?

-Sim, ele! –

Era Carla. Conversamos por alguns momentos e ela me disse que Eduarda Reys havia se interessado por mim, e que faria contato. Mal desliguei ele toca novamente.

-Alô, por favor, o senhor Kelldian? – Ela era, a voz dela, Eduarda Reys.

-Eduarda? – Pergunto no aguardo de sua  confirmação – A tonalidade  parecia combinar com os seus olhos castanhos e o sorriso que tanto me encantara.

Foi o que bastou para iniciarmos uma conversa e desligarmos depois de mais  de três horas. Falamos sobre diversas coisas, relacionamentos, família, sobre ela, sobre mim, e finalmente o nosso gosto pela literatura. Sensível, poetisa dotada de extrema percepção Eduarda acabou por recitar uma de suas poesias como estivéssemos num sarau. Também falei daquilo que  me era paixão. Falei dos meus contos, de alguns personagens sem rostos mas com resquícios de alma. Ali mesmo trocamos nossos e-mails com promessa de não perdermos contato. Ao desligar parecia que eu conhecera aquela mulher pela vida inteira.

No decorrer do mês persistimos no contato diário, ora por telefone, ora por correio eletrônico. Inclusive nos tornamos recíprocos ao ponto de comentarmos todas as  mazelas de nossas vidas, nossos fracassos e os poucos sucessos. Constantemente trocávamos e-mail com poesias, contos, ora sugestionando, ora criticando.
Recordo-me também que ela se impressionara com um dos meus personagens; Erico Zambini era seu nome, e segundo ela, ele se caracterizava por uma melancolia de um amargor doce.
Porém faltava-me algo. Faltava a posse daqueles  aqueles olhos  e  do sorriso tão perturbador e que não me permitia dormir sem relembrar dele. E a coisa fluiu até o chegado o momento de nos conhecer. Marcamos para um sábado; 19 horas.
Pontualmente e conforme o combinado eu a peguei defronte ao prédio que residia. Eduarda estava simplesmente sensacional. Eu senti arrepios ao cumprimentá-la à saída do edifício, uma sensação gostosa de tocar as suas mãos,  de sentir o perfume delicado e feminino envolvendo o ar.
Ao abrir-lhe a porta do carro, discretamente e sem que fosse sua intenção deixou-me ver uma nesga de suas exuberantes pernas, algo dum apelo tão sensual que jamais senti por outra mulher, apesar dos meus muitos relacionamentos.

Partimos e a duas quadras dali ganhei o estacionamento dum supermercado; meus cigarros  tinham terminado. Estacionei, desliguei a chave do contato e fitei-a. Eduarda jamais saberia, mas, existia nela tanta luz, talvez o suficiente para alegrar miseráveis e descartar incrédulos iguais a mim.
Portanto, ainda permanecíamos sentados e em completo  silêncio quando lembrei-me que na véspera  havia pedido para que me fizesse uma poesia. Como resposta ela dissera que não conseguiria assim de forma tão simples:

- Kelldian,  poesia não se encomenda. O que nela se traduz é simplesmente o estado de paixão por alguém ou algo.

Claramente Eduarda estava coberta de razão e eu não deveria ter tocado no assunto, mas, impulsivo que era, não consegui evitar. Em todo o caso tentei me justificar:

- Ultimamente ando muito pidão, né Duda? ( Eu gostava de chamá-la de  Duda ) - Ah....coisa de velho! Deixa pra lá! -  Completei sem perder o costume de ser tanto chantagista.

- Imagina, Kelldian...pidão nada. Se o não é dado, não custa buscar um sim. E outra coisa; “velho é trapo". Então, sem chances de você ser um. – Respondeu concentrada. Duda era escolada, e não seria tão fácil sugestioná-l.a

- Mas..não ando te pedindo muito  Duda? Veja...peço poesias, atenções, carinhos....
Ando abusando, não é meu anjo? Confesse! Juro que aguento! – Novamente um chantagismo psicológico em cena.

- Ta abusando não meu lindo...pronto, confessei. Você me faz bem- Devolveu com um sorriso nos lábios. Dessa vez eu tinha me dado um pouco melhor.

- Sabe...As vezes gostaria de ter uma bola de cristal para descobrir o que a Du pensa de tudo isso. Mas.....infelizmente eu não a tenho. Assim só resta deixar as letras descobrirem – Afirmei cerimonioso, assim, como se houvesse chegado a algum fantástico pensamento.

- Bem...a Eduarda, ou Duda, se preferir, pensa só coisas boas. Não gosto de deixar coisas ruins ocuparem espaços em minha vida, senão acabam por alastrar – Ela devolveu séria, determinada.

Depois sorriu e continuou -

-Pode ter certeza disso, Kelldian...se não jamais estaria aqui no carro com você. Deixa de tentar ser um Herculano Quintanilha...seja somente o Erico Zambini do brasil do meu coração – E riu. Um riso maroto, apesar da singeleza do tom.

Aquela mulher sabia como mexer comigo, parecia conhecer o meu ponto “G” afetivo. Eu saboreei cada espaço da sua frase, cada entreabrir de lábios. Eu simplesmente não consegui me conter e ri:

- Herculano Quintanilha, Du? Quer me fazer morrer de rir? . Adorei isso! Hum...Erico Zambini do Brasil do coração da Duda. – Depois continuei as minhas impressões:

-Bem... Acho que temos problemas à vista, Du! Tem um tal de Kelldian fazendo sinal. Provavelmente queira viajar nesse nosso trem. Sei não! Será melhor ele ficar de fora?
.
-Hum...O nome dele Kelldian, é? E o que você sabe sobre esse tal Kelldian? - Ela questionou  trazendo nos olhos um misto de surpresa.

- Sobre esse tal de Kelldian? Bem....às vezes acho que sei tudo. Outras...quase nada. Por vezes um sonhador que se impressiona com  sorrisos meigos ou com detalhes de sensíveis em textos.

Ela me olhava, questionadora. Era como se pretendesse saber com toda segurança quem era aquele homem.  Tossi discretamente  e segui:

-Vez em quando ele e suas atitudes me surpreendem. Como agora por ex; Ele entra no e-mail só pra checar se há mensagens suas. E quando não encontra  se torna lacônico e decepcionado. Estranho ele, não acha?

Eduarda prestava atenção. Depois desviou o olhar e o cravou no toca CDs como se ali houvesse respostas pras suas perguntas. Pensou por alguns instantes e falou:

-Bem, to começando a achar que esse tal Kelldian é igualzinho a todos nesse aspecto.
Os sonhadores são pessoas inteligentes. Eles encontram uma forma mais bonita de viver. Tentam colocar flores no caminho para melhor percorrê-lo aproveitando-se do perfume! –  Devolveu entusiasmada. Pelo jeito Duda achava os sonhadores interessantes. Depois continou:

- Eles são pessoas sensíveis, que se impressionam com sorrisos, com carinhos, com palavras! Para as pessoas sensíveis as pequenas coisas são gigantescas e fazem toda diferença – Aí então finalizou num tom emocionado: - Sabe Kelldian, obrigada pela sua sensibilidade e overdose de carinho!

Aquilo foi demais para mim. Eduarda sabia como ninguém tocar-me com suas conclusões.

- Olhe Duda! Estou sorrindo para você! Eu e você  somos permeados por overdoses de sonhos e realidades. Eu um sonhador, e você, bem, assim, excessivamente  realista e gentil.

Eduarda não fazia a menor idéia, mas me sentia sonhador, disposto  talvez a voar para Marte, África e lutar por algo que acreditasse. Talvez ela fosse o inverso. Talvez ela precisasse  sentir o chão e a terra por entre os vãos dos dedos. –  Duda persistia encanta, atenta à minha fala, aos meus gestos. Eu, por outro lado, desembestara a falar sem parar:

-Perceba, Duda.  Aqui estamos nós. Lados opostos num embate interessante, um jogo de quase sedução permeado por sonhos e realismos. Acho que o poeta sempre soube, apesar de jamais me sentir um, que o sonho jamais prevalece à razão. Finalizei num tom desanimado.

Ela continuava me fitando, algo encantada, talvez preocupada com a visão que passei. Ainda pensativa ela desviou o olhar de mim e outra vez fixou-se  no painel do veículo. Permanecíamos em silêncio. Repentinamente a tonalidade de sua voz transborda numa   poesia.. Duda declamava para mim :

Sonho e realidade/Sonho é poético/A vida também/Sonhar realidade/Ou realizar sonho/Faz muito bem!
A vida é irreversível/Poupá-la não convém/Jamais saberá o fim/Se não for além!

A vida é festa de alegria/É flor desabrochada/É sabido que a dor penetra/Mesmo sem ser convidada!
A fuga nunca foi segura/Só resta viver de fato/Na vida o que perdura/É o amor, e o seu ato!
E a razão, morre de paixão/Porque não dá o braço a torcer/Ela vibra de emoção/Mas tenta sempre esconder

Eu a ouvia deslumbrado. Tudo que conversáramos até então se encaixava em contexto. Poesia sua, feita no ato, de fato. Eu persistia aturdido e ela, ante a minha reação brincou:

-Kelldian, a vida é festa de alegrias! Uhuuuu... Mesmo sem ser convidada! quase fiz esta poesia

-Que gostoso, Duda! Ta vendo porque você- me deixa em estado de constante paixão? - Devolvi. E continuei:

-E saiba dona Eduarda....isso é poesia sim! Uma poesia da Duda para o Kelldian. Bem, .pelo menos isso, né? –  Naquele instante me sentia feliz.  
Mesmo que não quisesse seria impossível não gostar daquela mulher de olhar jovem e de atitudes surpreendentes. Eu me sentia um verdadeiro  jovem, um desses garotos galantes em suas calça jeans desbotadas que cursam o primeiro semestre de faculdade. Contudo, Duda era tímida ,dessa timidez franca, sincera, essas  que só encontramos em pessoas que realmente valem a pena:

- Kelldian, deixei de mencionar nesse projeto de poesia que é difícil escrever para poetas como você. Tu escreves pacas, te curto um absurdo. Gosto de te ler.
E saiba: a razão é uma invejosa que canta de galo, se acha a poderosa, mas prefere a emoção em prosa.

Outra vez o encanto. Eu me sentia indefeso; era como se uma serpente naja pudesse sair por entre aqueles bancos  e me picar; e eu nem sentiria.
Antes que déssemos a partida na direção do bar onde tomaríamos alguns drinks ela me sai com essa:

-Kelldian,.ia me esquecendo.... Nõ existe ninguém perigoso, ganhador ou perdedor.
O que existe é uma forma certa para negociar! – Ela sorriu e piscou.

Eu entendi o recado. Eu não era um ganhador, mas havia ali uma batalha onde  não se podia  tombar morto sem lutar. E em cada batalha haverá a possibilidade da vitória. E, para isso eu deveria seguir adiante e jamais desistir.

-Independência ou morte! – Exclamei.Ela riu,  nós rimos.

Dei a partida e o carro avançou suavemente. No primeiro farol o vermelho se abriu majestoso. Aguardei as pessoas passarem e elas pareciam tão sisudas,  preocupadas com suas vidas, seus tantos problemas e obrigações. Um fim de tarde morno fez surgir do nada um rapaz e seus malabares com o fogo. A vida estava dura, muito dura, dava para entender aquelas roupas de circo e o nariz de palhaço. Pouco antes do verde eu desço o vidro e lhe  dou algum dinheiro. Ele sorri e me olha agradecido. Antes que o carro partisse, ele diz:

-Aêêê tio! Boa sorte no babado! - Eu sorri. Provavelmente o “babado” ao que ele se referia deveria ser a  Eduarda - Eu olhei divertido. "Boa sorte no babado" murmurei e sorri novamente. Ele tão esperto como as suas tochas de fogo. De algum jeito ela sabia que eu precisaria de alguma sorte.

Mais uma vez fitei  aquela mulher madura e duma beleza quase juvenil e percebí que seus olhos cintilavam tão lindos que poderiam ofuscar o fulgor do sol ou a exuberância da lua.
O farol abriu e seguimos em frente. Sempre em frente. Em frente, para os lados, mas nunca para trás. Naquele instante  entrar  à direita ou à esquerda não faria a menor diferença. Era só seguir adiante procurando as marcas dum novo destino e jamais retroceder no olhar.

-Independência ou morte! – Exclammei mais uma vez para uma Eduarda que parecia feliz.

Talvez aquela noite não fosse uma como outra qualquer.

Copirraiti 26Jul2011
Véio China®

sábado, 2 de julho de 2011

Palhaço!

E o mundo gargalha diante aos olhos do palhaço; Ele não é engraçado, sabe que não.
Insiste, mas não consegue compreender o motivo de acharem tanta graça em seu jeito.
Talvez seja o olho maior que o outro ou a tinta esbranquiçada que tinge seu rosto ou mesmo o nariz avermelhado e arredondado do tamanho de uma bola de golfe.

Ele jamais pensou ou quis ser palhaço. Relembra a infância e o circo na cidade.
Um olhar encantado nas lonas coloridas e no leão peludo que parecia tão bravio
Vou ser domador – Exclamou divertido - Haveria de ser herói, igualmente, e ter as feras ao seu comando. E aquele leão que aguardasse! Haveria de ter o seu respeito e o medo era apenas passageiro O peludo haveria de sentir a autoridade de sua voz e os estalidos do chicote. Ah se haveria!

O tempo passou e não houve o leão e nem qualquer outra fera
Não houve quem obedecesse a tom de sua voz ou os estalidos da chibata que acoitava o ar.
Persistiu sim aquele encanto que jamais o abandonou, mesmo que socado a se ver fantasiado em roupas largas e super coloridas. Ele mesmo achava divertido aquele nariz enorme e vermelho, mas que não era o seu


Todo palhaço é solitário, sabiam?
E pra ele jamais houve companhia que não fosse o riso
Palhaço, palhaço! – Ele adorava quando gritavam, incentivavam
Ria palhaço! Pediam. E ele ria e ria e até acreditar que era o mais verdadeiro dos palhaços.
Palhaço não precisa de amor. Palhaço necessita do riso e de olhos de criança... Convencia-se

E agora, depois de tantos anos passados ele persiste palhaço.
Um palhaço de gestos lentos e rosto enrugado
Apenas um palhaço que ri, ri e continua a rir tanto
Até seu riso explodir num pranto de dor
Que ninguém sabe, imaginam ser apenas risadas
As risadas que ele sente da própria dor

Que palhaço eu fui? Escarnece de si. Para isso jamais houve resposta
E então ele continua rindo, rindo e rindo. É unicamente o que ele sabe fazer
Não mais incomodam as lágrimas que se fundem aos poros e borram o rosto até desabarem e fenecerem na boca imensa e azul
Ele é apenas um palhaço! É a única certeza que tem
Um palhaço a rir da compaixão que tem por si.


Copirraiti 02Jul2011
Véio China©